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Parecer conjunto da Quercus, do GEOTA e da LPN sobre o Plano de Pormenor da Zona Norte da Mata de Sesimbra

Parecer conjunto da Quercus, do GEOTA e da LPN sobre o Plano de Pormenor da Zona Norte da Mata de Sesimbra

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Sobre o Plano

O Plano de Pormenor da Zona Norte da Mata de Sesimbra, agora em discussão pública, prevê um empreendimento turístico para a zona da Herdade da Apostiça e sua envolvente, incluindo cinco núcleos habitacionais, com 2230 fogos e 5 hotéis, para uma ocupação total de 10666 habitantes, e dois campos de golfe, para além de outros equipamentos.

Dos antecedentes do PPZNMS, explicitados no Relatório Ambiental, depreende-se que o mesmo sofreu alterações, nomeadamente a redução da ocupação em cerca de um terço e a deslocação dos núcleos previstos para fora das áreas mais sensíveis (nomeadamente habitats prioritários para a conservação), numa articulação concertada com o ICNB.

O Plano reveste-se de uma roupagem ambientalmente responsável, ao procurar apresentar-se como um empreendimento ambientalmente sustentável e dirigido para a preservação e reabilitação da Mata de Sesimbra e dos seus habitats.

No entanto, uma análise detalhada do Plano, do seu Relatório Ambiental e do Estudo de Recursos Hídricos facilmente nos comprova que o empreendimento agora proposto em consulta pública está muito longe de ser um projecto sustentável do ponto de vista ambiental, colocando mesmo em risco a integridade da Mata de Sesimbra e do Sítio Natura (Sítio de Interesse Comunitário Fernão Ferro/Lagoa de Albufeira) onde se insere. Até mesmo do ponto de vista turístico, não é de todo enquadrável no conceito de turismo sustentável, pois que de turismo de massas se trata.

Com efeito, este Projecto não pode de todo ser dissociado dos projectos previstos, e já aprovados, para a sua envolvente, incluídos também na Mata de Sesimbra. De relembrar que o Plano de Pormenor da Zona Sul da Mata de Sesimbra prevê uma ocupação de quase 20000 camas e quatro campos de golfe. Juntando este Plano da Zona Norte e os projectos já existentes, ficamos com, nada mais, nada menos, do que 30000 camas e seis campos de golfe dentro da Mata de Sesimbra, o que se afigura manifestamente excessivo para um concelho que tem neste momento perto de 50000 habitantes, dos quais 25000 na sua envolvente imediata (os outros 25000 residem na Quinta do Conde, freguesia atípica do Concelho de Sesimbra). Estamos pois a falar de uma mais que duplicação da população na região.

Por outro lado, uma vez mais, analogamente ao Plano de Pormenor da Zona Sul da Mata de Sesimbra (PPZSMS), a maioria das camas previstas, mais de 80%, são camas em aldeamentos, o que configura um risco enorme em termos de garantia da vertente turística do projecto. Acresce a este risco, a falta de garantia da viabilidade económica do mesmo. Foi admitido pelos próprios promotores que este é um projecto a médio prazo, para não menos de 10 anos, provavelmente para bastante mais. Face a toda a oferta já prevista na sua envolvente imediata e até mesmo na Península de Setúbal e na envolvente desta, a viabilidade económica deste projecto é altamente discutível. Com efeito, este Plano e o já aprovado PPZSMS são concorrentes directos, colocando-se mutuamente em risco. E o risco de o projecto se transformar numa mera operação urbanístico-imobiliária, caso a vertente turística falhe, é enorme, conduzindo definitivamente a zona da Mata de Sesimbra a um processo de suburbanização. Este alerta já havia sido feito pelas ONGA aquando das consulta públicas do PPZSMS e do EIA do Empreendimento Turístico da Mata de Sesimbra Sul e, em nosso entender, mantém toda a sua actualidade.

Este plano aparece num contexto de crise económica profunda, em particular no sector imobiliário. Em Portugal as áreas designadas como urbanizáveis permitem construção para mais trinta (30) milhões de habitantes, e já existem 1,5 casas por família, fora os empreendimentos turísticos. As modernas políticas de ordenamento do território e urbanismo apontam claramente no sentido da densificação e requalificação dos núcleos urbanos existentes, e não da criação de novas expansões em mancha de óleo.

As infra-estruturas requeridas terão um custo de manutenção certamente elevado (mas não avaliado), num município onde a dispersão de infra-estruturas já é um problema complicado de gerir. Os consumos energéticos, tanto nos edifícios como nos transportes, serão igualmente elevados, num contexto em que a estratégia nacional e europeia aponta para a necessidade de contenção, tanto por motivos ambientais como económicos. Ou seja, não é verosímil que a concretização deste plano seja minimamente viável.

A incerteza da viabilidade deste Projecto coloca igualmente em causa que todas as boas intenções a ele associadas, como o Plano de Gestão Ambiental, sejam efectivamente implementadas daqui a 10 ou 20 anos. Por outro lado, as ONGA têm que se questionar sobre qual o interesse em acelerar a aprovação de um Plano que só terá viabilidade daqui a largos anos. Para mais, quando o PDM de Sesimbra se encontra actualmente em revisão. Não faz sentido apressar a aprovação de um Plano de Pormenor inviável no curto prazo quando o PDM se encontra no presente em revisão. Estamos pois em presença, uma vez mais, de uma total inversão do processo de planeamento que se nos afigura totalmente injustificável e inaceitável.

Análise de riscos e impactes

O Relatório Ambiental refere na sua análise de riscos e oportunidades do Plano, diversos riscos que, em nosso entender, irão contribuir inequivocamente para a degradação dos habitats e para a fragmentação do continuum natural que constitui a Mata de Sesimbra, colocando em risco habitats e espécies prioritários. Com efeito, mesmo não ocupando directamente as zonas de habitats prioritários, conforme especificações do ICNB, o Plano representa uma carga poluente e uma pressão fortes sobre esses mesmos habitats. De entre os riscos identificados no Relatório Ambiental, salientam-se a interferência com os corredores ecológicos definidos pelo PROTAML nos limites poente e sul da Herdade da Apostiça, a contaminação do aquífero (que apresenta vulnerabilidade média a alta) e a degradação da Lagoa Pequena por acréscimo de efluentes gerados pela ocupação urbana.

O Relatório refere mesmo que o PPZNMS não cumpre o estipulado no PROTAML, uma vez que opta pela dispersão dos núcleos habitacionais no interior da Mata de Sesimbra, em detrimento das directrizes preconizadas no PROTAML para uma maior concentração das áreas urbanas e o recentramento nas áreas urbanas já existentes.

Por outro lado, em termos de análise dos efeitos cumulativos, o Relatório Ambiental enumera uma quantidade considerável de impactes negativos significativos decorrentes da implementação de ambos os Planos Norte e Sul na Mata de Sesimbra e que decorrem todos eles do excesso de carga urbana na área de intervenção, nomeadamente a degradação dos habitats prioritários (incluindo a Lagoa Pequena), a degradação dos ecossistemas dunares, a diminuição da área florestal e o aumento de área impermeabilizada, com consequente diminuição da área para recarga do aquífero, diminuição da qualidade do ar e aumento do tráfego na zona, aumento da poluição nas águas superficiais, nomeadamente na Lagoa Pequena e na Lagoa de Albufeira, aumento da solicitação dos recursos hídricos para rega dos campos de golfe e potenciação de novos focos de poluição, aumento da população flutuante no concelho, um maior peso do parque habitacional para uso turístico/sazonal e até mesmo uma eventual sobrecarga do Hospital de Setúbal.

Em relação ao tráfego e às acessibilidades, é de relembrar que o Plano de Acessibilidades do Concelho de Sesimbra, elaborado aquando do PPZSMS, considerava que, mesmo com todas as medidas e projectos de acessibilidades implementadas, o Concelho não teria capacidade para satisfazer as necessidades preconizadas se o PPZSMS fosse efectivamente implementada. Facilmente se infere que o acréscimo de carga decorrente do PPZNMS contribuirá ainda mais para agravar os problemas de acessibilidades no Concelho, mesmo que todo o Plano de Acessibilidades seja executado.

Considerando todos os riscos e efeitos cumulativos negativos apresentados e referidos explicitamente, não se compreende como o Relatório Ambiental conclui que o Plano “assume no seu todo um efeito ambiental global positivo”. É de todo inaceitável esta conclusão, uma vez que muitos dos riscos e efeitos cumulativos referidos não podem ser minimizados e outros apenas poderão em parte ser mitigados mediante a implementação escrupulosa do Plano de Gestão Ambiental, o que não é de todo assegurado pela provável inviabilidade económica do Plano. Por outro lado, o faseamento do Plano também não é explícito nos documentos propostos, o que é absolutamente essencial num projecto com escassa ou nenhuma viabilidade. Sem faseamento explícito, não se consegue compreender como será implementado o Plano de Gestão Ambiental. Este plano não parece ser mais do que um artifício para criar a ilusão de valor futuro, uma reincidência da bolha imobiliária que foi uma das principais causas da crise económica presente, em Portugal como noutros países.

Do ponto de vista do modelo turístico, este PP é frontalmente contraditório com a iniciativa em curso da “Arrábida Património Mundial”. Esta iniciativa pretende apresentar a Arrábida ao Mundo como uma região ímpar, de valor extraordinário nas vertentes ecológica e sociocultural. Esta imagem será irremediavelmente prejudicada com a transformação da Mata de Sesimbra num subúrbio. Manter uma Mata de Sesimbra que seja uma mata é um factor importante para a projecção do município e da região como um destino turístico ímpar, o que a prazo será muito mais positivo (inclusive em termos económicos) do que a venda de alguns milhares de camas de imobiliário. Este PP põe seriamente em risco aquele modelo.

Disponibilidades hídricas

Um dos factores mais cruciais para um projecto desta dimensão e com estas características são os recursos hídricos e as pressões sobre eles exercidas. O Estudo de Recursos Hídricos refere a necessidade de os serviços camarários deverem garantir o acréscimo de disponibilidade de água para consumo humano em cerca de 800 mil m3/ano para a nova urbanização prevista. Nada no Plano nos afirma que estas disponibilidades estão garantidas. Este valor poderá estar claramente subestimado, uma vez que é consensual que um turista consome muito mais água do que um residente. Mesmo assim, um valor desta grandeza é superior a 10% do actual consumo humano anual do Concelho de Sesimbra (cerca de 7 milhões m3/ano; dados de 2009) o que, em conjunto com o consumo estimado para o vizinho empreendimento turístico da Zona Sul da Mata de Sesimbra, implica um aumento em cerca de 45% de consumo de água. Nada no Plano nos garante que este aumento não terá impactes significativos.

Por outro lado, o Estudo calcula a necessidade de garantir 1085 mil m3/ano para a rega dos campos de golfe e dos espaços verdes e para a manutenção dos lagos. Nos seus cálculos, o Estudo considera que se poderá reaproveitar as águas residuais, o que consideramos correcto e desejável. No entanto, baseia os seus cálculos considerando uma ocupação média de 80% do empreendimento, o que se nos afigura incorrecto, uma vez que o valor de referência das taxas de ocupação turísticas na região rondam, de acordo com dados do Turismo e aceites pelos próprios promotores do Plano, os 40 a 60%. Foi este também o valor de referência para o Empreendimento Turístico da Mata de Sesimbra Sul. Porque é que este empreendimento assume valores diferentes? Assim, dificilmente serão conseguidos os volumes anuais médios em águas residuais previstos no Estudo.

Os cálculos referidos no Estudo, apesar de considerarem vários cenários (ano normal, ano seco, ano muito seco) não fazem qualquer ajuste tendo em conta as alterações climáticas que induzirão, sem dúvida, alterações nos regimes pluviométricos, incluindo uma maior sazonalidade e concentração no tempo. Desse modo, os valores referidos, nomeadamente relativos às disponibilidades das águas superficiais e à recarga do aquífero poderão pecar por excesso, pelo que os impactes na Ribeira da Apostiça e consequentemente nos habitats adjacentes poderão ser muito mais negativos que o mencionado.

O Estudo refere ainda que não há garantias que a qualidade da água quer da Ribeira da Apostiça, quer dos furos existentes na Herdade, seja adequada para usos de rega, pois faltam análises específicas que o comprovem, o que significa que, caso uma das fontes se revele imprópria, as disponibilidades hídricas para abastecer o projecto ficam em causa, sem o recurso à rede pública de abastecimento. De referir ainda que as análises utilizadas como referência no Estudo datam de há mais de 20 anos (1985 e 1989), pelo que não temos efectivamente qualquer garantia que estas potenciais fontes de rega estejam disponíveis.

Em suma, os cálculos apresentados pelo Estudo de Recursos Hídricos carecem de confirmação, relativamente à viabilidade das fontes para a água de rega, e necessitam ainda de ajustes face a cenários mais gravosos de escassez hídrica tendo em conta as alterações climáticas, pelo que não apresentam garantias inequívocas de que o Plano em apreço seja sustentável do ponto de vista das necessidades hídricas.

Considerações finais

Tendo em conta os argumentos expostos, as ONGA signatárias consideram que o PPZNMS agora em consulta pública constitui um risco inaceitável para a coesão da Mata de Sesimbra e do Sítio Natura Fernão Ferro/Lagoa de Albufeira, promovendo a sua fragmentação, uma ocupação urbana excessiva em Rede Natura e na envolvente de habitats prioritários para a conservação, exercendo igualmente uma enorme pressão sobre os recursos hídricos, impactes e riscos agravados pela acumulação com os Planos previstos para a mesma zona e já aprovados (nomeadamente o Empreendimento Turístico da Mata de Sesimbra Sul). Prejudica ainda a candidatura “Arrábida Património Mundial”, uma iniciativa importante para o município e a região.

Face a uma conjuntura económica desfavorável, e a uma incerteza agravada sobre a sua viabilidade económica, as ONGA consideram que este Plano não deve ser sequer considerado, sem que ocorra a necessária revisão do PDM, a que este Plano deverá estar obrigatoriamente subjacente, conforme se encontra explícito no parecer da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo.

No entanto, uma vez que o PPZNMS, na sua configuração actual, representa um risco para a integridade e coesão da Mata de Sesimbra e para o Sítio de Interesse Comunitário Fernão Ferro/Lagoa de Albufeira, as ONGA signatárias consideram que o mesmo carece de uma profunda alteração das propostas apresentadas.

Lisboa, 7 de Outubro de 2011

As Direcções Nacionais da

Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza

GEOTA – Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente

LPN – Liga para a Protecção da Natureza