O Projecto Linhas eléctricas e aves tem como objectivo dar continuidade ao processo de compatibilização das redes eléctricas aéreas de alta e média tensão com a conservação das aves em Portugal Continental, através da minimização dos impactes negativos daquelas infra-estruturas nas aves selvagens. Este projecto inovador teve início em 2003 e resulta numa parceria exemplar entre ONG, entidades públicas e privadas através da celebração de protocolos de colaboração.
Águia Imperial Ibérica (Aquila adalberti) – uma das espécies mais ameaçadas em Portugal, cuja principal causa de morte não natural é a electrocussão com linhas eléctricas.
No âmbito dos diversos protocolos foram monitorizados 1740 km de linhas de média e alta tensão em 41 Áreas Classificadas (ver mapa 1) e IBAS (áreas importantes para as aves), que correspondem a cerca de 20% do total de linhas eléctricas aéreas existentes nas mesmas (8555km). Nas linhas monitorizadas foram encontradas 1677 aves colididas e electrocutadas de 117 espécies. Destas, 25% têm um estatuto de conservação desfavorável segundo o livro vermelho dos vertebrados portugueses, como a Águia Imperial Ibérica, a Águia de Bonelli, a Abetarda ou a Garça Vermelha. Das linhas monitorizadas foram identificadas até ao momento 569 km de linhas perigosas para a avifauna, sendo que 126 km já foram objecto de obras e até ao final de 2013 serão corrigidas mais 460km, correspondendo a 58% do total de linhas perigosas identificadas.
Mapa 1 – Dispersão territorial das linhas estudas, a vermelho os troços de linhas monitorizados, a verde , azul e roxo as AP e IBAS.
Quadro 1 – Linhas monitorizadas nos diferentes estudos, áreas protegidas e IBAS (Áreas importantes para as Aves) visitadas, linhas objecto de obras com medidas anti-colisão e anti-electrocussão e percentagem de linhas monitorizadas face ao total existentes nas AP (Áreas protegidas).
*Em análise
1. 2. 3.
4. 5.
1 e 2 – Águia de Bonelli (Aquila fasciata) adulta fêmea electrocutada – Autor: Samuel Infante
3 – Grifo (Gyps fulvus) electrocutado – Autor: Samuel infante
4 – Águia real (Aquila crysaetus) morta por electrocussão – Autor: Samuel Infante
5 – Águia de Bonelli (Aquila fasciata) – Autor: Joaquim Antunes
A mortalidade média estimada foi de 0.18 aves electrocutadas por apoio por ano e 3,4 aves colididas por km por ano no protocolo avifauna I (Infante et. al 2005), estimando-se que morram anualmente nas áreas protegidas em Portugal continental por colisão e eletrocussão cerca de 100 mil aves selvagens e em todo o território cerca de 300 mil aves por ano.
Quadro 2 – Linhas monitorizadas nos protocolos Avifauna e respectivos resultados de numero de aves detectadas e a Taxa de mortalidade real ( TMR) por Km por ano de linha elétrica.
No âmbito dos protocolos de colaboração foi criada uma Comissão Técnica e Científica Mista de Acompanhamento (CTALEA), constituída pelos representantes de todos os parceiros: QUERCUS, SPEA, EDP e ICNF.
A EDP Distribuição compromete-se a aplicar, após aprovação da comissão, o guia técnico de Redes – Linhas “Projecto e construção de infra-estruturas eléctricas em Áreas Protegidas, IBAS e em Zonas de Protecção Especial”, assegurando assim o cumprimento da Directiva Aves, designadamente do seu artigo 4º.
Desta forma, as novas linhas construídas nestas áreas serão mais seguras para as aves e terão melhor qualidade de serviço na distribuição de electricidade. Este documento poderá ser actualizado face ao surgimento de novos dados, tecnologias e equipamentos validados pela CTALEA.
As linhas identificadas nos estudos promovidos pela Quercus e SPEA e aprovadas pela comissão, como de elevada perigosidade para a avifauna, estão a ser alvo de obras de correcção e sinalização. Estas acções seguem as orientações propostas e aprovados pela referida comissão.
A EDP Distribuição procederá também à correcção de novas linhas ou troços de linhas existentes integrando tecnologias experimentais de minimização do impacte sobre a avifauna.
Foto 1 – FBF novo dispositivo anti-colisão a ser testado na eficácia da redução de mortalidade por colisão
Foto 2 – utilização de novas tecnologias de construção de linhas mais seguras para as aves – Tree Wire no PNTI (Parque natural do Tejo Internacional), no qual toa a extensão do cabo condutor esta coberta com isolamento.
Avaliação da eficácia de dispositivos anti eletrocussão e anti colisão
No que diz respeito à avaliação das medidas anti eletrocussão e anti eletrocussão para a média tensão foram avaliadas e monitorizadas a sua eficácia na redução da mortalidade das aves desde 2003. Foram avaliadas diversas soluções de dispositivos, na tabela abaixo encontram-se resumidos as eficácias dos diferentes estudos realizados. Os dispositivos anti eletrocussão demonstraram uma boa eficácia com valores entre 93% a 95% (Infante et al., 2005 e Costa & Infante, 2011).
No que diz respeito aos quatro dispositivos anti colisão testados os Fire Fly tipo fitas e tipo rotativo apresentam a melhor eficácia com 79% os tipo fitas com 78% respectivamente (ver gráfico 1 abaixo). As espirais duplas apresentam uma eficácia muito reduzida cerca de 40% de redução da mortalidade, e as espirais pequenas (8cm) apenas 30%.
Estas soluções foram aplicadas nos 460km de linhas corrigidas reduzindo anualmente a morte por colisão e eletrocussão de milhares de aves selvagens protegidas.
Gráfico 1 – Resultados da avaliação da eficácia dos diferentes dispositivos anti- colisão a nível nacional.
Relatório protocolo Avifauna I
Relatório protocolo Avifauna II
Relatório protocolo Avifauna III
Relatório protocolo Avifauna IV
Introdução
A relação entre aves e linhas eléctricas aéreas tem sido alvo de alguma preocupação em quase todo o mundo e motivou inúmeros estudos sistemáticos nos últimos 25 anos (e.g. Beaulaurier 1981, Tombal 1985, Bevanger 1999). O actual estado de conhecimento, aceite pelas várias entidades do sector da energia eléctrica, entidades públicas da área da conservação da natureza e associações de defesa do ambiente, aponta para a possibilidade de ocorrerem mortalidades significativas localizadas no tempo e no espaço. Sempre que se conjugam determinadas condições de habitat, presença de espécies sensíveis à colisão, condições meteorológicas desfavoráveis e linhas eléctricas, é de esperar taxas de mortalidade com significado biológico.
Figura 1 – Abetarda (Otis tarda ) colidida com linha de muito alta tensão no Alentejo
A colisão resulta do embate das aves com os cabos aéreos das linhas de Muito Alta Tensão (LMAT), com predominância para os cabos de terra, cuja secção menor dificulta a sua detecção pelas aves (Beaulaurier 1981). Todas as espécies podem colidir com os elementos das linhas eléctricas, mas características específicas como a fraca agilidade de voo e o comportamento gregário tornam alguns grupos de aves mais sensíveis (Janss 2000). Entre os grupos de aves referidos com mais frequência na bibliografia destacam-se as Aves Estepárias, as Aves Aquáticas, os Migradores Nocturnos e os Pombos. A probabilidade de colisão é particularmente grave em locais onde se concentram grandes quantidades de aves. Para alguns grupos de aves, como as rapinas diurnas, o risco de colisão está mais associado a comportamentos de caça e a padrões de voo a baixa altitude, dentro do território de nidificação.
Em resposta às várias situações de conflito identificadas nos EUA, na África do Sul e em muitos países Europeus, desenvolveram-se diversas soluções de minimização, que passam por um desenho cuidado de novos traçados, pela construção de novos tipos de apoios, pela protecção do efeito de contorno e de descargas atmosféricas sem recorrer a cabos de terra e pela sinalização dos cabos com estruturas que aumentem a sua detectabilidade pelas aves em voo (Beaulaurier 1981, Janss & Ferrer 1997, De La Zerda & Rosselli 2003). A chave para a eficácia destas soluções, aplicadas antes ou durante a exploração de linhas, passa por um conhecimento objectivo das espécies, habitats, tipos e localização de linhas de transporte mais associadas a acidentes de colisão.
Situação em Portugal
Em Portugal, a colisão de aves nas Linhas de Muito Alta Tensão começou a ser alvo de uma avaliação obrigatória desde 2000, na sequência do processo de aplicação da legislação sobre Avaliação de Impacte Ambiental. No entanto esta avaliação incide apenas sobre linhas construídas nos últimos anos, considerando-se então muito incipientes os conhecimentos sobre esta problemática na grande maioria da Rede Nacional de Transporte de energia eléctrica.
No sentido de completar importantes lacunas de conhecimento sobre a mortalidade de aves selvagens na Rede Nacional de Transporte, a QUERCUS-ANCN e a SPEA desenvolveram um estudo base de caracterização da situação em Portugal, no âmbito do protocolo celebrado entre a REN, S.A. e o então ICN. A recolha de dados próprios em linhas construídas antes de 2000 foi dirigida principalmente para Áreas Protegidas, Zonas de Protecção Especial (ZPE) e Zonas Importantes para Aves (IBA).
A análise dos resultados obtidos indicou que a área estudada é o factor que melhor explica a mortalidade diferencial de aves por colisão. A área estudada com maiores valores de mortalidade é a zona próxima de Ferreira do Alentejo, provavelmente devido a concentrações locais de espécies sensíveis à colisão.
Consulte aqui o relatório realizado:
Estudo sobre o ImpactodasLinhasEléctricasde Muito AltaTensão naAvifauna emPortugal
Os dispositivos anti-colisão habitualmente utilizados como medida de minimização nas linhas de transporte de electricidade são as espirais salva-pássaros ou espirais anti-colisão, “Bird Flight Diverters” (BFD’s). Estes dispositivos são instalados nos cabos de guarda com o objectivo de os tornar mais visíveis para as aves.
Figura 2 –Espiral anti-colisão –“Bird Flight Diverters” (BFD’s)
A introdução de tecnologias novas como “Firefly Bird Flapper”, que têm tido resultados positivos fora de Portugal, torna-se uma hipótese a considerar em alternativa aos BFD’s.
Figuras 3 e 4 – Dispositivo anti-colisão “Firefly Bird Flapper” – FBF (frente e verso)
Estes dispositivos anti colisão ainda não tinham utilizados em Portugal em linhas de Muito alta tensão, no ano de 2009 a Quercus e a REN S.A. promoveram um estudo de avaliação da sua eficácia comparativamente com os dipositivos BFD convencionais.
Estudo Inovador
Pretendeu-se desenvolver este estudo no Alentejo em algumas das Linhas monitorizadas anteriormente ao abrigo do protocolo REN/ICN. Nos locais seleccionados para o estudo ocorrem concentrações importantes de espécies ameaçadas, como a Abetarda, o Sisão ou o Grou, particularmente sensíveis a colisão com LMAT.
Figura 5 – Grou (Grus grus) colidido com a linha 1067 entre os apoios 174 e 175.
Figura 6 (esquerda) – Águia de asa redonda (Buteo buteo) colidida na Linha 1067
Figura 7 (direita) – Recolha de dados entre os apoios 160 e 161
Os objectivos do estudo foram:
a) Avaliar a eficácia dos dispositivos anti – colisão na redução da colisão de aves selvagens com os cabos de linhas de transporte de electricidade em muito alta tensão (LMAT) em Portugal;
b) Avaliar a eficácia de novos dispositivos existentes no mercado – “Firefly Bird Flapper”, a instalar a título experimental;
c) Determinar os impactes dos dispositivos de sinalização FBF na paisagem, nos períodos diurno e nocturno e no ambiente sonoro;
d) Identificar os critérios para a utilização dos diferentes dispositivos anti-colisão (BFD e FBF);
e) Desta forma pretende-se contribuir para a compatibilização do transporte de energia eléctrica e a conservação de aves selvagens particularmente ameaçadas.
Principais conclusões do estudo
Nos dois anos de estudo foram encontrados 385 aves das quais 352 colidiram com as linhas.Foram identificadas 55 espécies que colidiram com os cabos. Destas espécies aquela em quese verificou maior mortalidade foi a Ciconia ciconia (Cegonha-branca) com 85 indivíduos. Do total das espécies colididas encontradas apenas cerca de 2% (n=7) correspondem a espéciescom estatuto de ameaça. Na Linha 1067 a TME obtida na pré sinalização foi de 216 (aves/km/ano) e de 191 após a sinalização com FBF. A TME no controlo desta Linha foi de 23 e 159 (aves/km/ano) nos períodos anterior e posterior à sinalização, respectivamente.Na linha 1078 a TME na pré sinalização foi de 288 (aves/km/ano) e de 166 após a sinalização com BFD. No controlo, a TME foi de 156 e 165 (aves/km/ano) nos períodos anterior e posterior à sinalização, respectivamente.
Os valores de TME obtidos encontram-se todos acima dos valores médios de referência de 13,92 aves/km/ano (Neves et. al.2005), sendo que a frequência de amostragem e a taxa de remoção por necrófagos poderão ser os factores que justificam esta diferença tão significativa.
A eficácia na redução da mortalidade no troço sinalizado com FBF foi de 87,2% e no troços inalizado com BFD foi de 45,6%. Nos troços sinalizados com FBF ocorreu uma redução na mortalidade de Sisão e Grou apesar de não terem significado estatístico.
No que diz respeito ao padrão de voo das aves nos troços sinalizados verificou-se que asinalização das linhas provocou alterações significativas no comportamento das aves ao induzir uma passagem acima dos condutores e consequentemente uma redução das passagens abaixo dos condutores. Esta alteração foi mais significativa para os FBF com um aumento de 40% nos atravessamentos acima dos cabos, comparativamente com 30% para os BFD.
Na componente de ruído a análise dos resultados obtidos para os FBF, conclui-se que:
– a diferença de níveis medidos de LAeq de ruído ambiente (com os dispositivos “Firefly Bird Flapper” já instalados) e de ruído residual (antes da instalação dos dispositivos), é nula para o período diurno e entardecer, o que significa que os valores são fortemente influenciados pelo ruído residual (pouca ou nenhuma contribuição do ruído produzido pelos dispositivos);
Figura 8 – Trabalhos de medição do ruído
Para o descritor paisagem verifica-se que a linha é visível a uma maior distância que os FBF’s e considera-se que a presença dos FBF’s não determina, nem uma maior visibilidade da linha
em causa, nem um acréscimo no impacte da linha de muito alta tensão na paisagem.
A utilização de FBF’s na sinalização de linhas de MAT deverá ser equacionada no atravessamento de áreas consideradas muito críticas pelo Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade e, no caso de Linhas existentes, deverão considerar-se as situações de impacte significativo devido a mortalidade muito elevada em troços sinalizados com BFD’s, e que portanto, apresentem já sinalização do tipo excepcional.
Para mais informação consulte o relatório completo no link abaixo:
Relatório ESTUDO DE AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA DE DISPOSITIVOS ANTI COLISÃO
Medida financiada no âmbito do Plano de Promoção do Desempenho Ambiental, aprovado pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos