O regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial permite que governantes e autarcas utilizem a desculpa do interesse público para fazer dos planos de ordenamento do território simples cartas de intenções.
Hélder Spínola*
Os dados que a Quercus tem recolhido no âmbito do acompanhamento que faz à forma como os responsáveis políticos locais e nacionais definem e aplicam as regras de ordenamento, levam-nos a concluir que há uma causa de fundo associada à propositada indefinição das regras e à proliferação das excepções que permitem alterações pontuais “a gosto do cliente”.
Essa causa de fundo prende-se com o facto da transformação administrativa de um terreno rural num terreno com classificação de urbano, onde é possível construir, significar para alguém em particular um encaixe financeiro dezenas de vezes superior àquele que seria possível caso o ordenamento do território não tivesse sido alterado.
A solução passa por fazer retornar ao Estado o acréscimo no valor dos terrenos devido à sua reclassificação (as mais valias) e desta forma acabar com a especulação fundiária e imobiliária. Caso contrário e enquanto for possível aos autarcas pôr e dispor nas regras de ordenamento, qualquer área de Reserva Ecológica ou Reserva Agrícola Nacional, espaço florestal e todas as zonas não urbanas continuarão a ser encaradas como potenciais oportunidades de fazer dinheiro fácil.
Não é por acaso que quando surgem projectos industriais ou turísticos de maior dimensão, como são os projectos PIN (Potencial Interesse Nacional), os solos escolhidos para a sua implantação são os solos baratos, ou seja, aqueles onde não é possível construir.
Apadrinhados pelo governo e pelos autarcas, os proponentes destes projectos conseguem alterar o ordenamento território transformando a terra em ouro, conseguindo aquilo que muitos alquimistas procuraram e não conseguiram alcançar.
- Presidente da Direcção Nacional da Quercus