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Quercus apela à regulamentação da produção, recoleção e comercialização de cogumelos silvestres em Portugal

Objetivo é reforçar a fiscalização, combater o comércio ilegal transfronteiriço e proteger a biodiversidade natural

Apesar dos evidentes atrasos na produção de legislação que enquadre devidamente no ordenamento jurídico nacional esta atividade comercial, existem outros instrumentos que podem ser ativados para colmatar as falhas na Lei, como os Planos de Gestão Florestal, Zonas de Intervenção Florestal e a figura de agentes fiscalizadores da Natureza.

Com o início do Outono, observa-se o arranque de atividades de recoleção de cogumelos silvestres, num movimento em crescendo que reúne já milhares de pessoas e que se estende de norte a sul do país.

A perspetiva de geração de lucro em contexto de fragilidade económico-financeira, impulsionado pelo período de crise pandémica, alimenta a procura por cogumelos silvestres, com vista à sua comercialização, em mercado doméstico e também além-fronteiras. Adicionalmente, a consciencialização dos consumidores para os chamados “produtos sustentáveis” alimentou um aumento significativo da procura por produtos e recursos naturais. No decurso dos períodos de confinamento e de suspensão de dinâmicas e eventos de lazer e de foro cultural, muitas foram as pessoas que viram nas zonas rurais, algumas delas protegidas ao abrigo da legislação portuguesa, um escape, uma fonte adicional ou principal de rendimento e uma dimensão de recreio e entretenimento.

A maioria dos cogumelos silvestres comestíveis recolhidos em Portugal têm como destino a comercialização via mercados internacionais, principalmente em países como Itália, França e Espanha. Contudo, a falta de um enquadramento legal e regulamentar desta atividade está na raiz da escassez de dados sobre as quantidades e valores reais transacionados e da falta de fiscalização adequada. Esta falha consubstanciada permite que, anualmente, saiam do país, muitas vezes através de canais comerciais ilegais, milhares de toneladas de cogumelos silvestres.

A recolha de cogumelos silvestres em Portugal ainda carece de legislação específica. Os artigos contidos no código florestal (principalmente o artigo 64), que foi revogado em março de 2012, representam o único avanço prático no sentido de regulamentar este setor. É de realçar que as medidas presentes no referido documento são atuais e adequadas. Nos últimos anos diversas entidades, como associações micológicas, universidades, administração central e investigadores na área da micologia, já elaboraram propostas de legislação, tendo em vista a criação de uma Lei que enquadre a recoleção de cogumelos silvestres.

É, no entanto, de referir que, no âmbito do projeto “Promover os Recursos Micológicos” fruto de uma parceria entre a Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural e o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, foram disponibilizados online alguns materiais acerca da atividade de recoleção de cogumelos silvestres, como o Manual de Boas Práticas de Colheita e Consumo de Cogumelos Silvestres e o Guia do Coletor de Cogumelos. O projeto consagrou também ações de formação dirigidas a coletores, técnicos e formadores, inseridas no Programa Operacional Potencial Humano, definindo os seguintes cursos: Colheita de cogumelos silvestres; Produção de cogumelos comestíveis; Formadores em Micologia; e Técnicos de Micologia.

Não obstante, poucos ou nenhuns avanços legislativos ou regulamentares têm sido possíveis observar nesta matéria. Assim, e para que este vácuo legislativo não seja causa de danos aos ecossistemas ou à sua exploração indevida ou para fins ilícitos, existem outros instrumentos que podem ser acionados.

São dessas alternativas exemplo os Planos de Gestão Florestal e as Zonas de Intervenção Florestal, que podem incorporar “regulamentos próprios” para a recolha de um importante recurso, como são os cogumelos silvestres. A constituição do Centro de Competências dos Recursos Silvestres (CCRS), criado em novembro de 2016, poderá alavancar a implementação da regulamentação necessária ao setor.

Ainda, deve devotar-se maior atenção, empenho e recursos à formação dos agentes

fiscalizadores e demais agentes da natureza, à abertura de cursos de recoletor com a devida certificação (carta de recoletor), e, sobretudo, à implementação de estudos de monitorização técnica do atual e real panorama da atividade de recoleção de cogumelos silvestres, profissional ou amadora, para fins comerciais, lúdicos ou de consumo particular.

Sem dados técnicos e estatísticos reais, torna-se impossível desenvolver e implementar as medidas mais adequadas a esta atividade. Sem informação e formação adequadas, os interessados na recoleção de cogulemos silvestres têm como única opção o recurso a ferramentas duvidosas e acientíficas de identificação de exemplares micológicos (como redes sociais online, aplicações para dispositivos móveis ou conteúdos pseudo-informativos baseados em experiência prática mas sem fundamento científico sólido), que poderão colocar em risco a boa saúde e vida dos potenciais consumidores destes fungos e a vitalidade, saúde e funcionalidade dos ecossistemas em que suportam estes seres vivos e que são suportados por eles.

Alguns municípios, tal como o de Bragança (Plano de Ordenamento do Parque Natural de Montesinho, 2008), começam a estudar a possibilidade de criar regulamentação local para a recolha e venda de cogumelos silvestres nas áreas naturais sob a sua jurisdição administrativa.

Contudo, é preciso fazer mais e fazer melhor, procurando contornar a inércia ou falta de vontade do legislador em encontrar o necessário enquadramento legal para proteger as espécies micológicas e os seus ecossistemas, bem como para combater o comércio ilegal transfronteiriço destes fungos recolhidos em solo nacional.

Lisboa, 28 de outubro de 2021