No Dia Mundial da Combate à Desertificação e à Seca, em que este ano se assinalam também cinco anos do trágico incêndio florestal de Pedrógão Grande, a Quercus lamenta que pouco tenha mudado na recuperação dos solos e da Floresta Autóctone em Portugal e exige um reforço do investimento público para combater a seca e a degradação dos ecossistemas.
Em 2022, a UNCCD anunciou que a seca, com foco na ação precoce para evitar resultados desastrosos, é o tema do Dia da Desertificação e da Seca assinalado em 17 de junho de 2022. Por outro lado, a chamada de atenção por parte da ONU centra-se no propósito de transformar solos degradados em solos saudáveis.
Entre 1900 e 2019, as secas impactaram 2,7 bilhões de pessoas no mundo e causaram 11,7 milhões de mortes. Atualmente, as previsões estimam que até 2050 as secas podem afetar mais de três quartos da população mundial.
A nível global, segundo as Nações Unidas, devido às secas e desertificação, 12 milhões de hectares são perdidos todos os anos (a um ritmo de 23 hectares por minuto).
A UNCCD – Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca diz que 71 milhões de postos de trabalho podem ser criados até 2030, se conseguirmos cumprir os ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável fixados pela ONU na área da Alimentação e da Agricultura Sustentável.
No ODS 15 “Proteger a Vida Terrestre”, entre as metas definidas refere que até 2030, deve ser combatida a desertificação, restaurar a terra e o solo degradados, incluindo terrenos afetados pela desertificação, secas e inundações, e lutar para alcançar um mundo neutro em termos de degradação do solo.
A desertificação em Portugal
Segundo o Programa de Nacional de Ação de Combate à Desertificação, 32,6 % do território nacional encontra-se em situação degradada, e 60,3% estão em condições razoáveis a boas. A aridez dos solos atinge a totalidade do interior Algarvio e do Alentejo, está a progredir para as zonas do noroeste, tradicionalmente uma das mais pluviosas da Europa, e a aumentar nas zonas do litoral sul e montanhas do Centro.
A Quercus lembra que os solos degradados armazenam menos carbono, o que contribui para os efeitos das alterações climáticas, e além disso, os países mais afetados e vulneráveis à desertificação são, na sua maior parte, os mais pobres e menos desenvolvidos do Mundo. Sem solos saudáveis e produtivos, surge a pobreza, a fome e a necessidade de emigração, que muitas vezes gera conflitos e problemas humanitários gravíssimos.
Mas não é só nos países menos desenvolvidos que existe desertificação. Na Europa, em virtude das profundas alterações ocorridas durante as últimas décadas nas áreas rurais, os modelos tradicionais de gestão agro-silvo-pastoril sofreram profundas transformações e o valor económico e social da terra sofreu profundas transformações, que em muitos casos se traduziram na degradação dos solos e no consequente abandono da terra.
A Quercus aponta uma cadeia de fatores que contribuem para este fenómeno de aumento da aridez e desertificação em Portugal, além da suscetibilidade natural de algumas regiões:
– A utilização do solo com culturas agrícolas intensivas de regadio, às quais se encontram associados processos de degradação do solo, como a salinização, sobre-exploração dos aquíferos, contaminação do solo por pesticidas e fertilizantes, erosão do solo, e alterações da paisagem;
– A (re)arborização de milhares de hectares dos nossos espaços florestais com espécies exóticas e consequente perda de biodiversidade, destruição da floresta autóctone e esgotamento dos solos e dos aquíferos;
– Os milhares de hectares de área ardida que resultam dos incêndios recorrentes em Portugal e que provocam a libertação de elevadas quantidades de CO2 e outros compostos para a atmosfera e de elevados níveis de erosão e contaminação dos solos e linhas de água.
– Os problemas socioeconómicos, que afastam as pessoas do interior para as cidades do litoral, deixando as terras ao abandono.
Quercus apela ao compromisso de todos
Neste Dia Mundial de Combate à Desertificação e à Seca, a Quercus apela ao diálogo, ao compromisso e à ação de todos os parceiros dos vários quadrantes da sociedade (Governo, produtores agrícolas e florestais, empresas, indústria, sociedade civil) que, direta ou indiretamente, podem contribuir para a diminuição da desertificação dos ecossistemas através da utilização sustentável dos recursos naturais.
É urgente regenerar os ecossistemas terrestres, preservar os solos e os recursos hídricos. É urgente implementar políticas de combate à desertificação do território.
A Quercus pede medidas concretas e legislação específica que:
– Proteja de forma eficaz os últimos exemplares e bosquetes de Carvalhos autóctones;
– Obrigue à existência de uma floresta multifuncional e à compartimentação da floresta, de forma a quebrar a continuidade de monoculturas;
– Condicione as áreas de implementação de culturas agrícolas intensivas de regadio em zonas de montados de sobro e azinho, cujo declínio urge inverter;
– Regulamente ações de remediação em zonas de solos ameaçados ou já contaminados com medidas adequadas à sua atenuação, eliminação e/ou recuperação;
– Contemple um modelo de gestão ecológica do território, nomeadamente a urgente revisão dos critérios para as faixas de gestão de combustível que deveria ter sido publicada em janeiro deste ano.
Lisboa, 17 de junho de 2022
A Direção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza