União Europeia quer adiar medidas relativas à proteção dos recursos hídricos e Portugal apoia decisão

Os Estados-Membros, reunidos na passada sexta-feira no Conselho Europeu de Agricultura, indicaram que estão a considerar excluir a Diretiva Quadro da Água do regime de ecocondicionalidade (“cross compliance”) na proposta de reforma da Política Agrícola Comum. A Quercus tem conhecimento de que Portugal suporta esta decisão.

 

Na prática, isto significa que os agricultores que recebem assistência da PAC não serão obrigados a respeitar as obrigações decorrentes da principal norma legislativa da União Europeia relativa à proteção dos recursos hídricos (a Diretiva Quadro da Água -DQA), após 2014. Este facto é tanto mais surpreendente quando acontece poucas semanas depois da Semana Verde Europeia, que este ano foi dedicada ao tema “Água: cada gota conta”.

 

A poluição difusa com origem agrícola e os nutrientes e pesticidas são um dos maiores problemas em quase todas as bacias hidrográficas europeias. Nas bacias do Mediterrâneo e do Sul da Europa, a escassez de água e o elevado consumo para uso agrícola é outro dos problemas identificados. Em Portugal, cerca de 80% do consumo total de água destina-se ao setor agrícola. A escassez de água e a redução de caudais potencia fenómenos de poluição e de eutrofização das massas de água.

 

É de salientar que a implementação da Diretiva Quadro da Água no espaço da União Europeia se encontra muito atrasada. O Relatório da Agência Ambiental Europeia aponta que o objetivo da DQA – o bom estado ecológico das águas em 2015 – não será alcançado. Os Estados-Membros adiaram a maior parte das medidas a tomar para a segunda e terceira fases dos Planos, em 2021 e 2027, respetivamente. Portugal ainda não submeteu nem adotou qualquer Plano de Gestão de Região Hidrográfica1. É inaceitável que os Estados-Membros procurem adiar a implementação das medidas agrícolas relativamente à proteção dos recursos hídricos devido à sua negligência na implementação da DQA.

 

Deixar a PAC sem as componentes específicas relacionadas com a água e a proteção dos recursos hídricos até 2020 será desastroso para se conseguir o objetivo de atingir o bom estado ecológico na maioria dos rios, lagos e mares da Europa e implicará mais danos às águas da Europa, com custos elevados para a sociedade. Isto significa contas de água ainda mais altas para os contribuintes que estão na sua maioria já sobrecarregados com os custos da remoção de nutrientes e de agroquímicos agrícolas da água potável. Isto significa também que as águas costeiras e balneares vão continuar a ser atingidas com espessas camadas de algas no Verão. Isto significa ainda que a poluição dos nossos recursos hídricos subterrâneos estratégicos perderá este incentivo importante de prevenção.

 

A Reforma da Política Agrícola Comum pós-2013 deve reforçar a DQA para salvaguardar as águas da Europa, em vez de facilitar e promover a manutenção do mau estado de conservação das massas de água. Futuros pagamentos diretos da PAC necessitam de normas claras de ecocondicionalidade, com base na atual legislação da UE, incluindo a Diretiva Quadro da Água e a respetiva gestão das bacias hidrográficas, bem como a diretiva relativa à Utilização Sustentável dos Pesticidas. Todos os pagamentos provenientes da PAC devem proporcionar incentivos para o estabelecimento de práticas agrícolas mais sustentáveis e contribuir para alcançar os objetivos ambientais da UE (DQA e Natura 2000).

 

A Quercus não compreende como pode o Governo Português concordar com esta decisão, para mais quando o representante português nas negociações da Reforma da PAC (o Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território – o MAMAOT) integra as áreas da Agricultura e do Ambiente. Ainda esta semana, o MAMAOT apresentou o Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água (PNUEA), tendo dado destaque à necessidade de um aumento da eficiência no sector agrícola. Esta é a oportunidade de ouro de se conseguir uma verdadeira integração das políticas agrícolas e ambientais, no sentido da promoção de uma economia agrícola verdadeiramente sustentável que contribua para o desenvolvimento rural e do País.

 

A Quercus apela à Ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território e ao Governo para que reconsidere a posição do Estado Português nesta matéria e que aceite a integração das medidas de proteção dos recursos hídricos na reforma da PAC pós-2013.

 

Lisboa, 16 de junho de 2012

 

A Direção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza

 

 


1 – 24 Estados-Membros adotaram e reportaram 119 Planos de Gestão de Região Hidrográfica. À data, 4 Estados-Membros permanecem em falta. A Bélgica entregou os Planos relativos à Flandres e às águas costeiras, faltando ainda os Planos da Valónia e de Bruxelas. Em Espanha, apenas foram adotados os Planos de Região Hidrográfica da Província da Catalunha. Portugal e Grécia não adotaram ainda qualquer Plano. A Comissão Europeia instaurou um processo de infração junto do Tribunal Europeu aos 4 Estados-Membros em falta. Em Abril de 2012, a primeira sentença do Tribunal Europeu nesta matéria condenou a Grécia por incumprimento.