Conferência Rio+20: Quercus espera que o Brasil esteja à altura de construir bons consensos em maratona de 2 dias e meio

 

Nos trabalhos oficiais preparatórios a caminho da Conferência Rio+20, no Rio de Janeiro, o objetivo inicial era que no final de sexta-feira, dia 15 de junho, após três dias de reuniões, as discussões temáticas (economia verde, estrutura institucional, emprego, energia, oceanos, cidades sustentáveis, entre outros), permitissem chegar a textos praticamente finalizados. O documento final deverá ser aprovado pelos chefes de Estado e de governo na Conferência Rio+20 que tem lugar de 20 a 22 de junho.

 

Resultado da conferência preparatória que terminou à meia-noite de dia 15: 37% de parágrafos acordados no documento final (116 acordados de um total de 315)

 

Sabia-se que a tarefa era hercúlea, difícil e nalgumas áreas corria-se mesmo o risco de se agravar mais as divergências acumuladas em reuniões anteriores. Os textos setoriais têm ainda diferentes visões de países como EUA, Canadá e Japão e os G77 (países em desenvolvimento), com a União Europeia num posicionamento mais conciliador em várias matérias.

 

Aquando do início das reuniões na quarta-feira, dia 13, havia 21% de parágrafos acordados na sequência da última reunião realizada em final de maio em Nova Iorque. Três dias depois e na sessão oficial da conferência preparatória demorou cerca de uma hora e fez a síntese das reuniões setoriais, concluiu-se que há acordo em 37% dos parágrafos do documento final a sujeitar a aprovação na Conferência. Apesar de um avanço de 16%, principalmente conseguido ao longo das negociações de ontem, é bom lembrar que quantidade não significa qualidade e que há muitos assuntos cruciais ainda em aberto.

 

Neste quadro, o Brasil assumiu a responsabilidade como organizador da Rio+20 de conduzir negociações informais cujos moldes serão apresentados no sabado às 12h, hora do Brasil, e que terão de estar terminadas até ao final de segunda-feira, dia 18, antes da chegada dos chefes de Estado e governo participantes. Apesar do início dos diálogos do Rio+20 também este sábado, que coligirão ideias de especialistas e da sociedade civil, formulando propostas para os políticos (supostamente) ainda as integrarem, o Brasil tem a tarefa muito complicada de ultrapassar as divergências de forma a chegar a um texto final consensual em dois dias e meio, o que achamos ser impossível, mas pelo menos tentar chegar a uma versão que deixe apenas algumas arestas por ultrapassar durante a conferência. O otimismo existe mas é moderado porque se após muitas semanas foi pouco o que se avançou, menos de três dias é demasiado curto.

 

Não haver retrocesso já é um sucesso?

 

Havendo a necessidade
–  de permitir o acesso à água e à energia a uma parte ainda significativa da população que não para de crescer,
– de dinamizar um uso mais racional e distribuído dos recursos promovendo uma aposta forte na eficiência e na capacidade de regeneração dos ecossistemas,
–  assegurar a biodiversidade,
–  lidar com problemas globais significativos como as alterações climáticas recorrendo às energias renováveis, criando-se empregos em atividades com fraco impacte ambiental,
seria de esperar um caminho claro, programático, com financiamento associado – mesmo tendo em conta as limitações derivadas da crise existente – mas acima de tudo ambicioso no longo prazo.

 

Infelizmente, e a poucos dias das decisões que se desejam, não é isso que está a acontecer, mantendo-se divisões de conceitos, de perspetivas sobre as responsabilidades de cada país, e principalmente não se querendo tomar decisões eventualmente incómodas mas estruturantes para o futuro.

 

Por agora, o percurso dos trabalhos é tal, que em comparação com a ECO/92 há 20 anos que constituiu efetivamente um marco para o desenvolvimento sustentável das escalas local á global, há já quem diga que a Rio+20 será um sucesso se muitos dos princípios consensualizados anteriormente, como por exemplo o das responsabilidades comuns mas diferenciadas, se mantiverem. O “Futuro que Nos Queremos”, o lema do Rio+20, está assim ameaçado. Pode ser que a condução dos trabalhos pelo Brasil, que assume essa responsabilidade agora até ao final, consiga o desejável consenso para haver pelo menos algum sucesso.

 

Cúpula dos Povos – um olhar mais sentido para os mesmos problemas

 

Na Cúpula dos Povos que ontem começou no Aterro do Flamengo e em que a Quercus também participa, a abordagem é mais simples e pragmática – talvez também mais ingénua, mas claramente mais genuína. Uma conferência alternativa (e com visões até bastante opostas e uma forma de discussão muito diferente em relação à parte oficial – a Rio+20 – aberta à intervenção e participação de todos) que tem um acampamento, atividades culturais e muitos espaços de divulgação e discussão, bem como de partilha de produtos artesanais. “Como podem vir falar de ambiente quando são eles (empresas e políticos associados à Rio+20) que destroem as nossas florestas e a nossa água?” – dizia o cacique Magaron, chefe índio que hoje falava neste espaço.

Rio de Janeiro, 16 de junho de 2012

 

A Direção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza