Educação Ambiental: a Urgência da Reconexão

Sílvia Moutinho  | 10 de Setembro de 2025

Durante demasiado tempo falámos de “ambiente” como se fosse uma coisa fora de nós. Uma espécie de cenário: árvores ao fundo, rios a correr lá longe, mares que visitamos nas férias. O erro começa aqui. Ao tratarmos a natureza como algo exterior, esquecemos o essencial: o ar que respiramos, a água que nos atravessa, o solo que nos alimenta — tudo isso somos nós. Não existe “nós” e “o ambiente”. Existe apenas vida, entrelaçada.

A crise climática é o lembrete doloroso desse esquecimento. As cheias que arrastam casas, os fogos que consomem florestas, a seca que abre fendas na terra não são acidentes isolados. São a consequência de termos vivido como se a fronteira entre o ser humano e a natureza fosse real. Nunca foi.

É aqui que a educação ambiental ganha uma nova luz. Não é apenas uma disciplina para encher horários escolares. Não é uma lista de boas práticas ou de gestos simbólicos. Educar para o ambiente é educar para a vida. É reaprender a olhar o mundo natural como extensão de nós mesmos. Não é ensinar “a salvar a natureza”, é recordar que somos a natureza.

Na Quercus, esta reconexão tem sido construída ao longo de 40 anos. Uma ponte que atravessa gerações e territórios. Nas escolas, levámos hortas pedagógicas, oficinas de reciclagem, teatro ambiental, saídas de campo para ouvir o canto das aves, conhecer os rios, distinguir árvores autóctones de espécies invasoras. Em comunidades e associações, multiplicamos campanhas sobre resíduos, água, energia, biodiversidade — sempre com a convicção de que aprender a respeitar o ambiente é aprender a respeitar a nós próprios.

Não se tratou apenas de ensinar, mas de convidar à descoberta. Plantar uma árvore. Limpar uma praia. Sentir a textura da terra molhada. Ouvir a “Música das Plantas” e perceber que até o silêncio verde tem voz. Cada experiência foi um lembrete: a vida não está “lá fora”. A vida está dentro de nós, pulsa connosco, e somos parte dela.

É por isso que repetimos: só podemos amar e respeitar aquilo que conhecemos. Conhecer o voo de uma ave migratória ou a diferença entre as sombras frescas de cada árvore não é apenas aprender sobre ecologia. É conhecer-nos melhor a nós próprios.

E por isso nos causa profunda preocupação ver a Educação para a Cidadania relegar o ambiente para um papel secundário. Como se fosse um adereço. Como se houvesse cidadania possível sem consciência da casa comum que habitamos. É um erro. Num tempo de crise climática, de perda acelerada de biodiversidade, de fenómenos extremos que atravessam a vida de todos, não é aceitável tratar a educação ambiental como “extra” descartável. Ensinar a viver em comunidade é, antes de tudo, ensinar a cuidar do planeta que partilhamos. Retirar espaço ao ambiente é enfraquecer a capacidade coletiva de responder ao maior desafio do nosso tempo.

O futuro que desejamos — justo, sustentável, próspero — pede mais do que decretos-lei ou painéis solares. Pede uma mudança cultural. No Antropoceno, esta época em que a ação humana se inscreve na própria pele da Terra, precisamos de abandonar a lógica da exploração e adotar a consciência da interdependência. A saúde do rio é a saúde do nosso sangue. A fertilidade da terra é o alimento que nos sustenta. A diversidade da floresta é também a diversidade das nossas ideias, emoções e sonhos.

Quando destruímos a natureza, não acumulamos riqueza: empobrecemo-nos. Somos parte do mesmo ecossistema que tentamos dominar e, sem ele, não existiremos tal como somos. Entender esta verdade não é romantismo: é sobrevivência. É o primeiro passo para reconstruir uma forma de viver em harmonia com o planeta.

Educação ambiental, assim entendida, não é uma obrigação imposta de fora. É uma regeneração interior e coletiva. É dar às crianças, jovens e adultos a possibilidade de perceberem que cuidar do planeta é cuidar de si, da sua família, da sua comunidade. É devolver sentido à palavra “casa” — porque a nossa casa comum é o planeta inteiro.

O barro que fica depois da água, a sombra que uma árvore oferece, o voo incansável de uma ave migratória — tudo isto é linguagem, tudo isto é escola. Ao longo de quatro décadas, a Quercus tem-se afirmado como intérprete dessas mensagens e ponte entre elas e as pessoas. Não para ensinar que a natureza é um objeto a ser protegido, mas para recordar que respeitar a natureza é respeitar a nós mesmos.

No fim, é simples: não existe “nós” e “o ambiente”. Existe apenas vida — uma vida entrelaçada, em que cada gesto humano deixa marcas na paisagem e cada transformação da paisagem ressoa em nós. A educação ambiental é, por isso, a educação mais urgente do nosso tempo. Uma pedagogia de reconexão. Uma escola de vida.

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