QUERCUS alerta que mais de dois terços do eucaliptal ardido estão ocultos das estatísticas nacionais e propõe medidas de correção
O 5.º relatório provisório de incêndios rurais do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), publicado em setembro, revelou que é já o 4º ano com maior área ardida, desde 1996 (ano com dados disponíveis), com 254.296 ha ardidos em Portugal.
Importa realçar que no período homólogo e relativamente ao ano com maior área ardida, este valor é superior em cerca de 20 mil hectares.
No entanto a análise recente da Carta de Uso e Ocupação do Solo (COS) e da Carta de Ocupação do Solo Conjuntural (COSc), produzidas pela Direção-Geral do Território (DGT) com base em imagens de satélite do programa europeu Copernicus (Sentinel-2), evidencia deficiências estruturais que estão a comprometer a leitura da realidade florestal portuguesa e que comprometem os dados oficiais.
Senão vejamos: A COS, atualizada apenas de 5 em 5 anos, e os ortofotomapas que lhe dão suporte, cuja última edição remonta a 2018, apresentam um desfasamento significativo face ao território real, e para agravar esta situação, a COSc, de carácter anual, sofre do mesmo problema técnico pois classifica como “mato” vastas áreas de eucaliptal jovem, em regeneração ou em rotação após corte, mascarando assim a verdadeira extensão desta cultura florestal.
Para demonstrarmos este desfasamento importa dar exemplos concretos:
Incêndio de Arouca – No incêndio de Arouca, em 2024, arderam 6.500 hectares. A ocupação real da área afetada era superior a 80% de eucaliptal, sobretudo jovem. Contudo, a informação oficial classifica 62% da área como “fogo de mato”. Mais de metade dos eucaliptos surgem no satélite como “Transitional Woodland-shrubland”, ocultando estatisticamente a dimensão real do eucaliptal ardido, pois a área ardida é bastante superior e não está devidamente classificada e contabilizada.
Incêndio de Pedrógão – os relatórios do European Forest Fire Information System (EFFIS) assinalam 80% de “mato”, numa área onde 90% correspondia a eucaliptos jovens ou regenerações naturais.
Desta forma, podemos afirmar que mais de dois terços do eucaliptal existente em áreas ardidas fica ocultado das estatísticas nacionais por classificações incorretas, tendo como exemplo Povoamentos florestais que são registados como “mato” em várias fases do ciclo do eucalipto: até aos 5 a 8 anos de idade, até atingirem 5 metros de altura, após cortes sucessivos ou em estado de regeneração, estimando a QUERCUS que em incêndios de grandes dimensões dezenas de milhares de hectares de plantações sejam reportados à população apenas como “mato”, desvalorizando o risco e o impacto real nos territórios e comunidades.
Portugal continua, assim, a apresentar dados oficiais que desvirtuam a realidade florestal, alimentando uma perceção estatística e política incorreta sobre a dimensão do eucaliptal. Esta prática tem consequências graves na prevenção e combate aos incêndios, na avaliação ambiental e na definição de políticas públicas.
A QUERCUS recomenda a retificação urgente do protocolo de análise, garantindo a identificação correta das espécies florestais e uma atualização mais próxima do tempo real e defende que as plantações de eucalipto (e outras espécies florestais de rápido crescimento) passem a estar sujeitas a licenciamento obrigatório e georreferenciação em plataforma oficial do Estado, permitindo uma monitorização transparente e eficaz da ocupação do solo e da evolução do risco de incêndio.
A classificação atual da ocupação do solo em Portugal está a ocultar de forma sistemática a realidade do eucaliptal. Sem medidas urgentes de correção e de transparência, como a QUERCUS propõe, o país continuará a viver com uma narrativa oficial que distorce a realidade e compromete fortemente a segurança de pessoas e bens, assim como, um ordenamento do território e gestão florestal sustentável.
