Na sequência da apresentação pública da marca Natural.PT pelo Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e Energia (MAOTE), a Quercus vem alertar para a existência de erros graves ao nível da proposta de operacionalização que, caso não sejam corrigidos, transformarão uma boa ideia num mau projeto de execução, gerando desperdício de dinheiros públicos.
Antes de mais, a Quercus discorda que a marca Natural.PT possa vir a ficar associada única e exclusivamente à Rede Nacional de Áreas Protegidas. Se esta marca quer ter uma relação direta com o conceito de “Turismo de Natureza”, não faz qualquer sentido que as restantes Áreas Classificadas sejam excluídas (em particular as áreas integradas na Rede Natura 2000), mesmo que apenas numa primeira fase, de uma discriminação positiva das políticas públicas. Trata-se de repetir o mesmo erro duas vezes, já que, durante anos, os agentes económicos e as populações dos territórios de Áreas Classificadas que não coincidiam com Áreas Protegidas ficaram injustificadamente de fora da possibilidade de usufruírem das ferramentas disponibilizadas pelo atual Programa Nacional Turismo de Natureza.
Esta situação é ainda mais inaceitável tendo em conta que são patentes as restrições que impedem a implantação de usos e atividades incompatíveis com a conservação dos valores naturais e também porque hoje existem Municípios que querem transformar estas limitações em oportunidades, marcando a diferença em relação a outros territórios.
A Quercus vê também com apreensão que a organização da oferta se faça numa lógica de centralismo administrativo, de mero registo de produtos e serviços, e não numa lógica participativa e colaborativa entre os diversos agentes, a qual deveria resultar na atribuição de um certificado – a marca Natural.PT – à Área Classificada.
Tudo isto pressuporia trabalho prévio de envolvimento entre os Municípios, Juntas de Freguesia, operadores locais, área protegida, ONG’s, de forma a oferecer produtos e serviços organizados, atrativos e de excelente qualidade, naquilo que seria um processo, porventura mais longo, mas mais adequado às diferentes dinâmicas dos territórios em presença. Tal permitiria que as Áreas Classificadas pudessem entrar na rede em momento diferentes, até porque a sua inclusão só deveria premiar o mérito e a qualidade, resultando da articulação entre os diversos atores locais.
A marca Natural.PT deverá resultar do somatório das agregações de interesses, estrategicamente concertada em torno de cada uma das Áreas Classificadas e não meramente de uma listagem de aderentes com intervenções específicas.
Por outro lado, a Quercus tem também dúvidas sobre se o ICNF estará apto a operacionalizar este programa, face à sua crónica indisponibilidade de recursos humanos e financeiros. Como tal, seria importante ponderar a hipótese da gestão da marca ser objeto de uma concessão por concurso público a uma entidade com experiência e reconhecido mérito. Nesse cenário, ao ICNF ficaria reservado o papel, não menos importante, de regulação, acompanhamento de proximidade e de avaliação permanente da sua implementação, garantindo que não seriam desvirtuados os princípios orientadores do Natural.PT.
Neste contexto, a Quercus faz um apelo ao MAOTE para que repense esta opção pelo caminho mais fácil, definindo um novo modelo que alargue o programa de imediato a todas as Áreas Classificadas; que aceite a maturidade ambiental que se vem manifestando no País e que envolva os agentes locais e as Autarquias, promovendo uma estratégia de pequenos passos. Ainda há tempo para garantir que os financiamentos do Portugal 2020 não correspondam a uma oportunidade perdida de valorizar os territórios (quase um ¼ da área terrestre) que necessitam de uma atenção urgente e muito especial por parte das políticas públicas.
É com o pressuposto destas notas que se dará a participação da Quercus.
Lisboa, 31 de julho de 2014
A Direção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza