Dia Europeu Sem Carros em Lisboa foi menos do que simbólico

A Quercus lamenta que a capital do pais, exemplo paradigmático dos graves problemas de congestionamento de tráfego patentes nos grandes centros urbanos, apenas se tenha associado simbolicamente à iniciativa europeia.

 

O encerramento ao tráfego de um troço da Rua Rosa Araújo em Lisboa perdeu completamente o seu objectivo simbólico, uma vez que a restrição do acesso aos automóveis não foi efectivamente cumprida, tendo-se verificado durante todo o dia o atravessamento da via por veículos de mercadorias e veículos privados de passageiros.

 

A adesão das autarquias à iniciativa europeia do Dia Sem Carros e da Semana Europeia da Mobilidade não se deveria pautar pela adopção de medidas casuísticas de propaganda com o intuito de camuflar a falta de uma estratégia de mobilidade para os seus municípios.

 

Contrariando a tendência europeia, em Portugal o número de municípios a aderir à iniciativa do Dia Sem Carros e da Semana Europeia da Mobilidade tem vindo sistematicamente a diminuir nos últimos anos. Este ano, apenas 61 municípios a nível nacional participaram, 15 dos quais na Área Metropolitana de Lisboa.

 

A Quercus salienta no entanto que, a par da sensibilização dos cidadãos, os participantes na iniciativa deveriam implementar medidas efectivas para a promoção de uma mobilidade sustentável.

 

Os municípios de Almada e Oeiras constituem bons exemplos de estratégias integradas de politicas de mobilidade, mediante a adopção de planos de mobilidade integrando as várias vertentes sociais, económicas e ambientais.

 

Lisboa recebe diariamente 240 000 veículos

 

Segundo os últimos dados relativos à mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa, e citados pelo Prof. José Manuel Viegas (IST, aquando do Colóquio sobre Mobilidade promovido pela Câmara Municipal de Lisboa na última sexta-feira, Lisboa recebe diariamente cerca de 240 000 veículos. Este número equivale a duas faixas da auto-estrada A1 Lisboa-Porto, completamente cheias.

 

Ainda de acordo com a mesma fonte, permanecem em Lisboa durante a noite cerca de 171 000 veículos, entrando de manhã mais 84 000 e saindo da cidade 27 000. O valor máximo de 240 000 é atingido por volta das 11 horas da manhã, mantendo-se constante até cerca das 16 horas. O tráfego de atravessamento atinge os 100 000 carros. Destes 240 000 veículos, 32%, ou seja, um terço estaciona ilegalmente.

 

O número de viagens que toca diariamente a capital do país ronda os 2 300 000. A maioria dos veículos ligeiros de passageiros transporta apenas o próprio condutor.

 

Recordando os elevados valores de poluição atmosférica que se verificam nos centros urbanos, e em particular no centro da cidade de Lisboa, e analisando os dados agora divulgados, a Quercus vem uma vez mais alertar para a necessidade urgente da adopção de planos integrados de gestão de tráfego e estacionamento, no sentido de inverter a tendência actual de aumento do tráfego rodoviário individual.

 

Medidas para a promoção de uma mobilidade sustentável

 

A Quercus considera absolutamente essencial a adopção integrada do seguinte conjunto de medidas:

 

- penalização efectiva do estacionamento ilegal, com um aumento das coimas e o pagamento real das mesmas;

 

- construção de parques de estacionamento dissuasores na periferia, preferencialmente junto a interfaces de transportes públicos ferroviários;

 

- adopção de planos municipais de estacionamento para uma gestão global da oferta de estacionamento público;

 

- incentivo à utilização de transportes públicos, mediante uma melhor articulação dos diversos modos de transporte, nomeadamente entre os concelhos da periferia;

 

- integração de modos de transporte alternativo nas redes viárias e de transportes públicos, como a bicicleta para percursos de curtas distâncias, de que é exemplo a experiência, pioneira no nosso pais, do concelho de Almada;

 

- introdução de portagens diferenciadas, de acordo com o número de ocupantes do veículo;

 

- introdução de portagens nos centros de Lisboa e Porto, analogamente à experiência até agora bem sucedida de Londres;

 

- alargamento das áreas interditas ao tráfego rodoviário nos centros urbanos;

 

- incentivos à renovação das frotas de transportes públicos, com introdução de equipamentos menos poluentes;

 

- simplificação dos tarifários dos transportes públicos, reduzindo o custo das viagens sempre que possível;

 

- operacionalidade das Autoridades Metropolitanas de Transportes;

 

- promoção de um ordenamento do território a nível nacional, regional e local que proporcione a ocupação das áreas urbanas centrais das grandes cidades, ao contrário de continuar a promover a residência na periferia e os consequentes movimentos pendulares.

 

A Quercus adverte no entanto para a (quase) inutilidade destas medidas, quando adoptadas de forma casuística, e em conjunto com outras que se revelam incongruentes com a estratégia de inversão da tendência de congestionamento do tráfego urbano.

 

De entre as medidas que têm sido seguidas quer pela Administração Central, quer pelas administrações locais, salientamos o aumento do preço dos transportes públicos que cremos ser um claro desincentivo ao seu uso.

 

Destacamos ainda a contínua construção de silos automóveis e parques subterrâneos que se tem verificado nos centros urbanos, e de que são um último exemplo os silos das Portas do Sol e da Graça agora em construção, bem como a construção e alargamento de novas vias rodoviárias de acesso aos centros das cidades, como medidas que conduzem claramente a um aumento do tráfego urbano.

 

O pais não pode continuar a comportar os elevados investimentos em transportes públicos, e em especial na ferrovia suburbana, sem que sejam adoptadas medidas complementares de dissuasão da utilização do transporte individual que coadjuvem os investimentos praticados.

 

Lisboa, 22 de Setembro de 2004

A Direcção Nacional e o Núcleo Regional de Lisboa da Quercus - Associação Nacional de Conservação da Natureza

 

 

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