Pioneer cancela dois pedidos de ensaios de transgénicos, mas volta a tentar associando-se à Syngenta

Começou esta semana a consulta pública de mais um conjunto de pedidos para ensaios experimentais de milho transgénico não autorizado para cultivo comercial.(1) Nos dois últimos anos a Pioneer pretendeu testar milho transgénico (Ponte da Barca/Cadaval em 2005 e Ponte da Barca/Arcos de Valdevez em 2006) mas enfrentou fortes dificuldades: as câmaras do Cadaval e de Ponte da Barca rapidamente se declararam Zonas Livres de Transgénicos e todas produziram pareceres onde deixavam clara a sua rejeição quanto a tal escolha. A empresa acabou por se ver forçada a desistir de tais intenções, em parte por deficiências graves na documentação apresentada.(2)

 

Em 2007 a Pioneer volta a tentar, desta vez associada à Syngenta e com três novas localizações: Alcochete, Salvaterra de Magos e Rio Maior. Alcochete é uma escolha irónica: a sua Assembleia Municipal aprovou, por unanimidade, a criação de uma Zona Livre de Transgénicos em 28 de Dezembro de 2006. Em relação aos ensaios agora propostos pela Pioneer/Syngenta, o presidente da Assembleia Municipal de Alcochete, Dr. Miguel Boieiro, já declarou que «Somos contra todo o tipo de experiências, não suficientemente seguras sob o ponto de vista científico e ético, que podem pôr em causa a biodiversidade presente e futura. A actual geração não tem o direito de alienar a segurança e o bem-estar dos seres humanos e outros que, a seguir, virão habitar o Planeta». Esta atitude provocatória ao poder local por parte da Pioneer e da Syngenta revela um total desrespeito pela vontade dos cidadãos na declaração das zonas livres de transgénicos.

 

Embora as Zonas Livres de Transgénicos careçam ainda de fundamentação legal em termos europeus, a sua criação e vantagens são reconhecidas ao mais alto nível. No «Relatório sobre a coexistência de culturas geneticamente modificadas com culturas convencionais e ecológicas» (2003/2098(INI)) o Parlamento Europeu reconhece que a proibição regional do cultivo de transgénicos é provavelmente a forma mais eficaz e de baixo custo para evitar a contaminação das culturas convencionais e biológicas.

 

Em Portugal a criação de Zonas Livres está regulamentada por uma Portaria anómala (a 904/2006) que, na prática, impede e esvazia a sua criação legal. A contradição é de tal forma evidente que os municípios já começaram a manifestar-se: em 29 de Dezembro passado a Assembleia Municipal de Aljezur aprovou por unanimidade uma moção(3) que protesta vivamente contra o articulado, entre outras razões por efectivamente impedir a protecção das zonas de minifúndio, precisamente as mais expostas à contaminação.

 

Em termos científicos, o cultivo de milho transgénico experimental envolve impacto ambiental significativo, nomeadamente em espécies não-alvo.(4) O próprio IUCN, uma estrutura internacional a que pertence o governo português, aprovou em 2004 e reiterou em 2006 um apelo à criação de uma moratória mundial à libertação de quaisquer transgénicos no ambiente «até que se demonstre a sua segurança para a biodiversidade, saúde humana e animal» (Resolução 3.007).

 

Acima de tudo, nem a Pioneer nem a Syngenta se mostram merecedoras de confiança. Na Pioneer os incidentes e desmandos com sementes transgénicas formam já uma longa lista. Em 1999 na Alemanha e na Suíça a Pioneer vendeu sementes contaminadas com transgénicos. A mesma coisa aconteceu na Áustria em 2001 e em Itália em 2003. Na Croácia em 2004 queimaram-se dois mil hectares de milho da mesma empresa também por causa de contaminação. Em Espanha foi ainda mais grave: a Pioneer organizou demonstrações para agricultores onde incluiu... milho transgénico totalmente ilegal, a maior parte do qual não se sabe onde terá ido parar.

 

A Syngenta, por seu lado, foi a responsável por um dos maiores casos de contaminação de sempre: o do milho transgénico Bt10, do qual se venderam milhares de toneladas embora não estivesse autorizado em país nenhum do mundo. A empresa demorou quatro anos a detectar o problema e, quando o fez, adiou quanto pode o informar das autoridades europeias - que só souberam meses depois, quando a imprensa publicou uma fuga de informação provavelmente obtida junto do governo americano.

 

Os portugueses estão maioritariamente contra os transgénicos. As câmaras que se têm pronunciado ecoam os mesmos sentimentos. O ambiente está em causa. Será que a Syngenta e a Pioneer ainda não perceberam que as suas sementes geneticamente manipuladas não são bem vindas em Portugal?

 

 

(1) Vide www.iambiente.pt/portal/page?_pageid=73,426033&_dad=portal&_schema=PORTAL&not_c_qry=boui=12330949

ou ainda gmoinfo.jrc.it/gmp_browse.aspx

(2) Nos dossiers técnicos que serviram de base aos pedidos de autorização a Pioneer deixava aspectos fundamentais completamente omissos. No tocante ao impacto ambiental (impacto em espécies não alvo, a possibilidade de contaminação de variedades tradicionais ou a indução de resistência nas pragas) a Pioneer optava por afirmar a ausência de risco, com 100% de optimismo e 0% de fundamentação científica. O plano de monitorização (obrigatório) era apresentado de forma tão abstracta que não comprometia com coisa nenhuma. Da mesma forma não era considerada a necessidade de uma caução ou seguro de risco ambiental ou agrícola, ou a informação aos agricultores limítrofes dos terrenos em causa.

(3) Disponível em www.stopogm.net/?q=node/148

(4) Ver por exemplo Loevei, Arpaia (2005) The impact of transgenic plants on natural enemies: a critical review of laboratory studies. Entomologia Experimentalis et Applicata 114:1-14.

 

A Plataforma ´Transgénicos Fora do Prato´ é uma estrutura integrada por onze entidades não-governamentais da área do ambiente e agricultura (ARP, Aliança para a Defesa do Mundo Rural Português; ATTAC, Associação para a Taxação das Transacções Financeiras para a Ajuda ao Cidadão; CNA, Confederação Nacional da Agricultura; Colher para Semear, Rede Portuguesa de Variedades Tradicionais; FAPAS, Fundo para a Protecção dos Animais Selvagens; GAIA, Grupo de Acção e Intervenção Ambiental; GEOTA, Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente; LPN, Liga para a Protecção da Natureza; MPI, Movimento Pró-Informação para a Cidadania e Ambiente; QUERCUS, Associação Nacional de Conservação da Natureza; e SALVA, Associação de Produtores em Agricultura Biológica do Sul) e apoiada por dezenas de outras. Para mais informações contactar Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.">Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar. ou www.stopogm.net

 

 

 

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