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Ao Governo Portugu\u00eas e \u00e0 Comiss\u00e3o Europeia<\/strong><\/p>\n Numa altura em que s\u00e3o cada vez mais evidentes os impactes da queima de biomassa sobre os ecossistemas, as popula\u00e7\u00f5es e o clima, a\u00a0Trustenergy\u00a0<\/i>(uma\u00a0joint venture<\/i>\u00a0entre a ENGIE e a Marubeni), principal acionista da Central Termoel\u00e9trica do Pego, em Portugal, com uma pot\u00eancia total de 628 megawatts, anunciou a inten\u00e7\u00e3o de converter a unidade de queima de carv\u00e3o para a queima de \u201cres\u00edduos\u201d florestais, mas que, na pr\u00e1tica, se traduzir\u00e1 sem d\u00favida na queima de arvoredo.<\/p>\n Em condi\u00e7\u00f5es m\u00e9dias de opera\u00e7\u00e3o, a central ir\u00e1 gerar cerca de 508 GWh por ano, correspondente a uma necessidade de consumo anual de biomassa de 1,1 milh\u00f5es de toneladas por ano [1]. Todavia, com a central a funcionar na sua plena capacidade, \u00e9 muito prov\u00e1vel que o Pego venha a necessitar de um valor que poderia aproximar-se das 5 milh\u00f5es de toneladas de madeira [2]. Neste contexto e em qualquer dos casos, a procura acrescida de mat\u00e9ria-prima ultrapassaria em muito os recursos dispon\u00edveis [3].<\/p>\n Pese embora que se alegue apenas vir a queimar \u201cres\u00edduos\u201d florestais na central do Pego, o facto \u00e9 que, de acordo com as regras atuais da UE, este termopode incluir qualquer tipo de madeira<\/a>, sejam res\u00edduos das ind\u00fastrias da madeira ou arvoredo. Acresce que, para a produ\u00e7\u00e3o de eletricidade, queimar biomassa florestal residual [4] tem uma enorme inefici\u00eancia energ\u00e9tica e avultados custos de extra\u00e7\u00e3o, transporte, armazenamento e no funcionamento dos equipamentos da central. Por isso, o que se encontra na maior parte dos parques das centrais a biomassa ou nas unidades de produ\u00e7\u00e3o de\u00a0pellets<\/i>\u00a0de madeira n\u00e3o s\u00e3o \u201cres\u00edduos\u201d, mas sim se\u00e7\u00f5es de troncos de \u00e1rvores (toros).<\/p>\n Um dos cen\u00e1rios mais prov\u00e1veis para o fornecimento de biomassa ao Pego seria a rolaria de eucalipto, situa\u00e7\u00e3o que aumentaria a procura por madeira desta esp\u00e9cie, em concorr\u00eancia direta com unidades muito pr\u00f3ximas de produ\u00e7\u00e3o de pasta e papel [5]. O facto tenderia a criar condi\u00e7\u00f5es para a instala\u00e7\u00e3o de novas \u00e1reas de monoculturas na bacia hidrogr\u00e1fica do rio Tejo, o que poderia agravar ainda mais os problemas associados aos grandes inc\u00eandios. Tamb\u00e9m exigiria maior press\u00e3o sobre as importa\u00e7\u00f5es de madeira de eucalipto por Portugal, a partir de Espanha, do Uruguai ou de\u00a0Mo\u00e7ambique<\/a>, que come\u00e7ar\u00e1 a exportar este ano.<\/p>\n A outra op\u00e7\u00e3o prov\u00e1vel seria a queima de pellets de resinosas (sem torrefa\u00e7\u00e3o) no Pego, designadamente a partir de pinheiro bravo, aproveitando a capacidade de produ\u00e7\u00e3o instalada em Portugal [6], contribuindo para um maior desequil\u00edbrio na\u00a0taxa de procura j\u00e1 insustent\u00e1vel de madeira de pinho em Portugal<\/a>. Todavia, com toda a certeza, esta segunda op\u00e7\u00e3o levaria \u00e0 importa\u00e7\u00e3o de pellets em grandes quantidades, a partir de pa\u00edses como os\u00a0Estados Unidos<\/a>\u00a0e do\u00a0Canad\u00e1<\/a>, onde a produ\u00e7\u00e3o de pellets para produ\u00e7\u00e3o de eletricidade, principalmente na Europa, j\u00e1 causa grandes impactos nas florestas locais.<\/p>\n Qualquer aumento na utiliza\u00e7\u00e3o industrial de arvoredo em Portugal contribuir\u00e1, no imediato, para um agravamento da perda de coberto arb\u00f3reo, com destaque para as esp\u00e9cies aut\u00f3ctones, j\u00e1 em decl\u00ednio acentuado no pa\u00eds [7]. Os impactes decorrentes da queima de biomassa para a produ\u00e7\u00e3o de eletricidade s\u00e3o j\u00e1 devastadores em termos de conserva\u00e7\u00e3o dos solos, da capacidade de armazenamento de \u00e1gua e da manuten\u00e7\u00e3o da biodiversidade [8]. A possibilidade de se vir a recorrer \u00e0 sua queima na central do Pego agravaria ainda mais o n\u00edvel de emiss\u00f5es de gases de efeito estufa, uma vez que a sua utiliza\u00e7\u00e3o n\u00e3o \u00e9 neutra de forma alguma, porque as emiss\u00f5es associadas s\u00e3o muito piores do que as decorrentes da queima dos combust\u00edveis f\u00f3sseis [9].<\/p>\n A concretiza\u00e7\u00e3o da convers\u00e3o da central do Pego exigir\u00e1 uma forte subsidia\u00e7\u00e3o p\u00fablica e um esfor\u00e7o financeiro acrescido por parte dos consumidores de eletricidade. O financiamento p\u00fablico \u00e0 queima de \u00e1rvores para a produ\u00e7\u00e3o de eletricidade, designadamente atrav\u00e9s do Fundo para uma Transi\u00e7\u00e3o Justa e do Plano de Recupera\u00e7\u00e3o e Resili\u00eancia, poder\u00e1 vir a servir interesses especulativos e nunca ser\u00e1 justo, nem garantir\u00e1 recupera\u00e7\u00e3o econ\u00f3mica, muito menos resili\u00eancia do territ\u00f3rio face \u00e0s amea\u00e7as das altera\u00e7\u00f5es clim\u00e1ticas e do colapso da biodiversidade.<\/p>\n Importa assim alocar financiamento p\u00fablico no apoio \u00e0 requalifica\u00e7\u00e3o e cria\u00e7\u00e3o de novos postos de trabalho na regi\u00e3o, em particular os que possuem liga\u00e7\u00e3o \u00e0 promo\u00e7\u00e3o de fontes de energia verdadeiramente renov\u00e1veis, para compensar uma eventual perda de postos de trabalho com o encerramento da unidade de carv\u00e3o na central do Pego. O fundamental \u00e9, ainda, direcionar a subsidia\u00e7\u00e3o p\u00fablica para apoio aos propriet\u00e1rios rurais, na conserva\u00e7\u00e3o de habitats e no est\u00edmulo \u00e0 ado\u00e7\u00e3o de sistema de produ\u00e7\u00e3o verdadeiramente sustent\u00e1veis.<\/p>\n Pelo exposto, as organiza\u00e7\u00f5es signat\u00e1rias apelam ao Governo portugu\u00eas e \u00e0 Comiss\u00e3o Europeia para n\u00e3o viabilizarem o financiamento p\u00fablico \u00e0 queima de \u00e1rvores para a produ\u00e7\u00e3o de eletricidade na central do Pego.<\/p>\n <\/p>\n Lisboa, 21 de junho de 2021<\/p>\n As organiza\u00e7\u00f5es signat\u00e1rias,<\/p>\n Portugal<\/strong><\/p>\n <\/p>\n Internacional<\/strong><\/p>\n Amis de l\u2019Afrique Francophone – B\u00e9nin (AMAF-BENIN)<\/strong>, B\u00e9nin;\u00a0ARA<\/strong>, Germany;\u00a0BankTrack<\/strong>, International;\u00a0Biofuelwatch<\/strong>, UK\/U.S.;\u00a0CENSAT Agua Viva – Amigos de la Tierra Colombia<\/strong>, Colombia;\u00a0Centre for Environmental Justice<\/strong>, Sri Lanka;\u00a0Climate Reality Europe<\/strong>, International;\u00a0Coal Action Network<\/strong>, UK;\u00a0Coastal Plain Conservation Group<\/strong>, U.S.;\u00a0Comit\u00e9 Schone Lucht<\/strong>, Netherlands;\u00a0De Woudreus<\/strong>, Netherlands;\u00a0Deutsche Umwelthilfe e.V. (DUH)<\/strong>, Germany;\u00a0Dogwood Alliance<\/strong>, U.S.;\u00a0Duurzaam Dorp Diemen<\/strong>, Netherlands;\u00a0Earth Thrive<\/strong>, UK\/Balkans;\u00a0EKOenergy ecolabel<\/strong>, International;\u00a0Federa\u00e7\u00e3o de \u00d3rg\u00e3os para Assist\u00eancia Social e Educacional (FASE)<\/strong>, Brazil;\u00a0Federation of Community Forestry Users Nepal (FECOFUN)<\/strong>, Nepal;\u00a0Fern<\/strong>, Belgium;\u00a0Forests of the World<\/strong>, Denmark;\u00a0Forests, Climate and Biomass Working Group, Environmental Paper Network<\/strong>, International;\u00a0Forum \u00d6kologie & Papier<\/strong>, Germany;\u00a0Friends of Fert\u0151 Lake<\/strong>, Hungary;\u00a0Friends of Siberian Forests<\/strong>, Russia;\u00a0Friends of the Earth\/BUND<\/strong>, Germany;\u00a0Front Commun pour la Protection de l\u2019Environnement et des Espaces Prot\u00e9g\u00e9s (FCPEEP)<\/strong>, DR Congo;\u00a0GE Free NZ in Food and Environment<\/strong>, Aotearoa\/NZ;\u00a0GeaSphere<\/strong>, South Africa;\u00a0Global Forest Coalition<\/strong>, International;\u00a0Global Justice Ecology Project<\/strong>, U.S.\/ International;\u00a0Healthy Forest Coalition N.S.<\/strong>, Canada;\u00a0Justica Ambiental – JA! Friends of the Earth Mozambique<\/strong>, Mozambique;\u00a0Landelijk Netwerk Bossen- en Bomenbescherming<\/strong>, Netherlands;\u00a0Leefmilieu<\/strong>, Netherlands;\u00a0Les Amis de la Terre Togo<\/strong>, Togo;\u00a0Mighty Earth<\/strong>, International;\u00a0Milj\u00f8bev\u00e6gelsen NOAH Friends of the Earth<\/strong>\u00a0Denmark<\/strong>, Denmark;\u00a0Mobilisation for the Environment<\/strong>, Netherlands;\u00a0Mom Lobes Taiwan Association<\/strong>, Taiwan;\u00a0Nature Nova Scotia<\/strong>, Canada,\u00a0NRDC (Natural Resources Defense Council)<\/strong>, U.S.;\u00a0P\u00e4\u00e4stame Eesti Metsad (Save Estonia’s Forests)<\/strong>, Estonia;\u00a0Partnership for Policy Integrity<\/strong>, U.S.;\u00a0Pivot Point<\/strong>, U.S.;\u00a0Protect the Forest<\/strong>, Sweden;\u00a0Reclaim Finance<\/strong>, France;\u00a0Rettet den Regenwald e.V.<\/strong>, Germany;\u00a0ROBIN WOOD<\/strong>, Germany;\u00a0Salva la Selva<\/strong>, Spain;\u00a0SEE Change Net<\/strong>, S.E. Europe;\u00a0Southern Environmental Law Center<\/strong>, U.S.;\u00a0Spruill Farm Conservation Project<\/strong>, U.S.;\u00a0The Climate Reality Project<\/strong>, Brazil;\u00a0Urgewald<\/strong>, Germany;\u00a0Water Justice and Gender<\/strong>, Netherlands;\u00a0Wild Europe<\/strong>, International;\u00a0Workshop for All Beings<\/strong>, Poland;\u00a0YUVA<\/strong>, Turkey.<\/p>\n Notas adicionais:<\/strong><\/p>\n [1] De acordo com a \u201cAvalia\u00e7\u00e3o do ciclo de vida da gera\u00e7\u00e3o de eletricidade numa central termoel\u00e9trica a carv\u00e3o convertida para biomassa florestal<\/a>\u201d, de Tobias de Jesus Prud\u00eancio Pereira (Universidade de Coimbra, 2019).<\/p>\n [2] Equivalente a cerca de 2,6 milh\u00f5es de toneladas de pellets assumindo 8.000 horas de opera\u00e7\u00e3o por ano e uma efici\u00eancia de 38%.<\/p>\n [3] De acordo com o\u00a0relat\u00f3rio<\/a>\u00a0de 2013 elaborado pelo Parlamento Portugu\u00eas, para a produ\u00e7\u00e3o de biomassa florestal residual em Portugal \u00e9 apontado a disponibilidade potencial anual de 2.2 milh\u00f5es de toneladas, um valor que merece especial aten\u00e7\u00e3o para contrariar os efeitos de uma sobre-explora\u00e7\u00e3o da biomassa, de forma a que seja assegurada a sua renova\u00e7\u00e3o. O consumo efetivo de biomassa florestal residual para energia, em 2013, j\u00e1 era estimado acima dos 3 milh\u00f5es de toneladas anuais, entre a queima para energia e a produ\u00e7\u00e3o de pellets de madeira. Apesar disso, s\u00f3 em 2016 e 2017 foram atribu\u00eddos licenciamentos a 8 centrais termoel\u00e9tricas de biomassa com a pot\u00eancia superior a 150 megawatts, o equivalente a uma necessidade de biomassa florestal residual pr\u00f3xima dos 2 milh\u00f5es de toneladas anuais. Por outras palavras, a sobre-explora\u00e7\u00e3o da biomassa tornou-se mais evidente, o que coloca ainda mais em causa a sua capacidade de renova\u00e7\u00e3o.<\/p>\n [4] Nos espa\u00e7os florestais n\u00e3o se produzem \u201cres\u00edduos\u201d. A atividade silv\u00edcola gera sim sobrantes, mat\u00e9ria org\u00e2nica que pode ter v\u00e1rias utiliza\u00e7\u00f5es. Entre elas, os sobrantes da atividade silv\u00edcola e da explora\u00e7\u00e3o florestal constituem um excelente fertilizante org\u00e2nico, sobretudo, depois de triturado ou estilha\u00e7ado. Este \u00e9 um uso primordial num pa\u00eds de solos maioritariamente pobres em mat\u00e9ria org\u00e2nica. Outro uso, no plano estritamente local, \u00e9 a produ\u00e7\u00e3o de calor, nomeadamente para aquecimento de infraestruturas sociais ou de unidades do sector agroalimentar.<\/p>\n [5] H\u00e1 que ter em considera\u00e7\u00e3o que a regi\u00e3o onde est\u00e1 instalada a central do Pego tem j\u00e1 instaladas unidades da ind\u00fastria de celulose e papel (Const\u00e2ncia e Vila Velha de R\u00f3d\u00e3o), algumas unidades de transforma\u00e7\u00e3o de madeira serrada (Sert\u00e3) e de produ\u00e7\u00e3o de lenha, bem como unidades de queima de biomassa para eletricidade (Fund\u00e3o) e de produ\u00e7\u00e3o de pellets de madeira (Oleiros, Proen\u00e7a-a-Nova, Coruche). Assim, a eventual convers\u00e3o de carv\u00e3o para a queima de \u00e1rvores na central do Pego ir\u00e1 agravar substancialmente a press\u00e3o sobre os espa\u00e7os arborizados da regi\u00e3o, fazendo aumentar drasticamente a procura por madeira.<\/p>\n [6] De acordo com um\u00a0estudo internacional<\/a>, Portugal \u00e9 o quarto maior fornecedor de pellets de madeira \u00e0 reconvertida central termoel\u00e9trica de Drax, no Reino Unido, com uma pot\u00eancia instalada de 4000 megawatts.<\/p>\n [7] De acordo com dados do\u00a0Banco Mundial<\/a>, a taxa de cobertura florestal em Portugal diminuiu de 37,15% em 1990 para 36,16% em 2018, admitindo uma ligeira recupera\u00e7\u00e3o entre 2010 e 2015 de 0,65%.<\/p>\n [8] De acordo com um recente\u00a0relat\u00f3rio da OCDE<\/a>, Portugal \u00e9 o quarto pa\u00eds membro e o segundo da Uni\u00e3o Europeia com a maior perda relativa de \u00e1reas naturais e seminaturais registada entre 1992 e 2018.<\/p>\n![](\"https:\/\/quercus.pt\/images\/logos%20cortar%20no%20carvao.png\")
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