{"id":13830,"date":"2021-03-06T11:16:32","date_gmt":"2021-03-06T11:16:32","guid":{"rendered":"https:\/\/quercus.pt\/?p=13830"},"modified":"2021-03-10T16:06:51","modified_gmt":"2021-03-10T16:06:51","slug":"a-agricultura-industrializada","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/quercus.pt\/2021\/03\/06\/a-agricultura-industrializada\/","title":{"rendered":"A agricultura industrializada"},"content":{"rendered":"

A agricultura industrializada \u00e9 caracterizada pela mecaniza\u00e7\u00e3o do trabalho agr\u00edcola e a depend\u00eancia de factores de produ\u00e7\u00e3o externos, alheios \u00e0 explora\u00e7\u00e3o agr\u00edcola, tal como combust\u00edveis f\u00f3sseis, fertilizantes e pesticidas. A moderniza\u00e7\u00e3o da agricultura, que corresponde \u00e0 industrializa\u00e7\u00e3o da agricultura, baseia-se na perspectiva de que o sector agr\u00edcola n\u00e3o difere significativamente de outras ind\u00fastrias, sendo necess\u00e1rio racionalizar o uso de recursos com vista a alcan\u00e7ar uma maior efici\u00eancia nos processos de produ\u00e7\u00e3o.<\/strong><\/p>\n

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Hist\u00f3ria da industrializa\u00e7\u00e3o agr\u00edcola<\/p>\n

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Esta racionaliza\u00e7\u00e3o foi envisionada e justificada com base numa ci\u00eancia reduccionista, que procurou encontrar solu\u00e7\u00f5es universalmente aplic\u00e1veis, ignorando a complexidade das condi\u00e7\u00f5es locais e a necessidade de adaptar os novos conhecimentos e tecnologias \u00e0s condi\u00e7\u00f5es do local onde haviam de ser implementados, para que o desenvolvimento fosse harmonioso.<\/p>\n

Durante o processo de moderniza\u00e7\u00e3o agr\u00edcola, as tecnologias tradicionais s\u00e3o substituidas por tecnologias industriais, produzidas fora da comunidade rural. Simult\u00e2neamente o conhecimento local \u00e9 subsituido pelo conhecimento cient\u00edfico, tamb\u00e9m este proveniente sobretudo do exterior da comunidade rural. Cria-se assim uma situa\u00e7\u00e3o de depend\u00eancia crescente da comunidade rural do exterior, de factores sobre os quais a comunidade rural n\u00e3o tem controlo. A introdu\u00e7\u00e3o de tecnologias e conhecimentos externos, n\u00e3o adaptados \u00e0s condi\u00e7\u00f5es ecol\u00f3gicas e sociais locais, desencadeou a eros\u00e3o da cultura camponesa, com consequente homogeniza\u00e7\u00e3o sociocultural, provocando degrada\u00e7\u00e3o ambiental ao n\u00edvel das explora\u00e7\u00f5es agr\u00edcolas.<\/p>\n

A industrializa\u00e7\u00e3o da agricultura foi fortemente impulsionada ap\u00f3s a segunda guerra mundial, no que veio a ser conhecido como “Revolu\u00e7\u00e3o verde”, atrav\u00e9s da introdu\u00e7\u00e3o de pol\u00edticas que visionavam o aumento da produ\u00e7\u00e3o agr\u00edcola, com o objectivo de alcan\u00e7ar a seguran\u00e7a alimentar, em regi\u00f5es onde persistia o racionamento de alimentos e a fome. Na altura da guerra-fria a auto-sufici\u00eancia agro-alimentar era considerada fundamental na Europa, para garantir a estabilidade e indeped\u00eancia de cada pa\u00eds.<\/p>\n

A industrializa\u00e7\u00e3o da agricultura aumentou a produtividade agr\u00edcola significativamente, levando \u00e0 produ\u00e7\u00e3o de excedentes, apesar do crescimento populacional verificado. No entanto, este sucesso trouxe consigo consequ\u00eancias sociais e ambientais nefastas.<\/p>\n

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Pesticidas<\/p>\n

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Al\u00e9m da ind\u00fastria de armamento apenas a ind\u00fastria agroqu\u00edmica de produ\u00e7\u00e3o de pesticidas tem como objectivo produzir materiais ou subst\u00e2ncias mort\u00edferas. Pesticida \u00e9 o nome gen\u00e9rico dado \u00e0s subst\u00e2ncias que visam matar organismos indesejados, podendo ser agrupados em herbicidas, fungicidas, insecticidas, etc, de acordo com o grupo de organismos alvo (ervas\/plantas, fungos e insectos, nestes casos).<\/p>\n

A maioria dos pesticidas cont\u00e9m subst\u00e2ncias activas que interferem com vias metab\u00f3licas fundamentais ou processos fisiol\u00f3gicos vitais. Estas vias metab\u00f3licas e estes processos fisiol\u00f3gicos s\u00e3o comuns a uma grande diversidade de organismos, pelo que os pesticidas geralmente n\u00e3o s\u00e3o muito selectivos na sua actua\u00e7\u00e3o destrutiva. Isto significa que, para al\u00e9m de um dado pesticida eliminar uma esp\u00e9cie de praga, elimina todos os bichos ou ervas minimamente parecidos \u00e0 praga. Um fungicida, por exemplo, n\u00e3o mata apenas o fungo que ataca as folhas de uma planta, mas tamb\u00e9m as micorrizas, que s\u00e3o constitu\u00eddas por fungos altamente ben\u00e9ficos e importantes para o desenvolvimento normal da maioria das plantas.<\/p>\n

Os pesticidas est\u00e3o tamb\u00e9m associados a resurg\u00eancias de pragas e ao desenvolvimento de resist\u00eancias nas pragas. Como a maioria dos pesticidas n\u00e3o s\u00e3o muito selectivos, frequentemente a aplica\u00e7\u00e3o de um pesticida n\u00e3o elimina apenas a praga, mas tamb\u00eam os seus inimigos naturais (predadores, parasitas). As pragas podem reproduzir-se mais rapidamente e s\u00e3o mais abundantes que os seus inimigos naturais e assim, as pragas podem reaparecer com maior pujan\u00e7a ap\u00f3s a aplica\u00e7\u00e3o de pesticidas, obrigando a um uso cada vez mais frequente de pesticidas e em doses mais elevadas. No entanto, existem diversos mecanismos atrav\u00e9s dos quais as pragas podem desenvolver resist\u00eancias aos pesticidas! Por isso \u00e9 necess\u00e1rio desenvolver-se constantemente novos pesticidas e novos cultivares resistentes.<\/p>\n

Mesmo em condi\u00e7\u00f5es de produ\u00e7\u00e3o agr\u00edcola muito controlados, res\u00edduos de pesticidas podem permanecer no meio, ser lavados para a \u00e1gua e absorvidos pelas plantas passando para os alimentos em quantidades sub-letais. Um estudo avan\u00e7ou a ideia de que os custos associados aos problemas de sa\u00fade e de descontamina\u00e7\u00e3o de \u00e1guas, provocados pelos pesticidas, s\u00e3o maiores do que os custos que estariam associados \u00e0s pragas no caso de n\u00e3o se aplicar pesticidas.<\/p>\n

A Organiza\u00e7\u00e3o Mundial da Sa\u00fade (WHO) calculou recentemente que todos os anos aproximadamente 25 milh\u00f5es trabalhadores agr\u00edcolas sofrem intoxica\u00e7\u00f5es devido a pesticidas, dos quais 20.000 casos s\u00e3o mortais.<\/p>\n

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Fertilizantes<\/p>\n

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A redu\u00e7\u00e3o da disponibilidade de nutrientes nas terras agr\u00edcolas, devidas quer \u00e0 exporta\u00e7\u00e3o de nutrientes contidos nos produtos agr\u00edcolas, quer \u00e0 elimina\u00e7\u00e3o de res\u00edduos org\u00e2nicos das terras ar\u00e1veis ap\u00f3s a colheita, quer devido \u00e0 eros\u00e3o do solo, foi remediada com a aplica\u00e7\u00e3o de fertilizante sint\u00e9ticos. Os adubos de origem animal foram substituidos gradualmente, \u00e0 medida que as explora\u00e7\u00f5es se foram especializando, ou em produ\u00e7\u00e3o vegetal ou em pecu\u00e1ria. O que levou ao advento do problema de falta de nutrientes numas e excesso de nutrientes em outras explora\u00e7\u00f5es.<\/p>\n

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Os adubos qu\u00edmicos s\u00e3o constitu\u00eddos sobretudo pelos 3 macronutrientes Azoto (N), F\u00f3sforo (P) e Pot\u00e1ssio (K). A aduba\u00e7\u00e3o com produtos sint\u00e9ticos \u00e9 geralmente excessiva em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 capacidade de absor\u00e7\u00e3o das plantas. A por\u00e7\u00e3o dos fertilizantes que n\u00e3o \u00e9 absorvida pode alterar a comunidade bi\u00f3tica do solo e ser lixiviada para os cursos de \u00e1gua superficiais ou fre\u00e1ticos. O fosfato \u00e9 relativamente im\u00f3vel no solo, mas o Azoto \u00e9 lavado facilmente pela \u00e1gua da chuva, podendo provocar eutrofiza\u00e7\u00e3o. A eutrofiza\u00e7\u00e3o consiste num crescimento excessivo de algas e outros microorganismos aqu\u00e1ticos, devido ao excesso de nutrientes. Este crescimento excessivo de certas esp\u00e9cies altera a composi\u00e7\u00e3o ecol\u00f3gica do sistema aqu\u00e1tico e pode consumir o Oxig\u00e9nio dissolvido na \u00e1gua rapidamente, provocando a morte da maioria dos seres vivos aqu\u00e1ticos.<\/p>\n

Os fertilizantes facilmente sol\u00faveis alteram tamb\u00e9m o equil\u00edbrio osm\u00f3tico entre a raiz das plantas e a solu\u00e7\u00e3o do solo e alteram a propor\u00e7\u00e3o relativa de nutrientes dispon\u00edveis para o crescimento vegetal, podendo provocar o crescimento desequilibrado da planta (como por exemplo crescimento r\u00e1pido em altura, produzindo colmos demasiado fr\u00e1geis para suportar o peso da espiga).<\/p>\n

Os fertilizantes em excesso no solo podem tamb\u00e9m ser acumulados nas plantas acabando por contaminar os alimentos, constituindo, desta forma, a causa de variados problemas de sa\u00fade. A rela\u00e7\u00e3o entre o excesso de nitratos (resultantes da fertiliza\u00e7\u00e3o azotada) e alguns tipos de c\u00e2ncro j\u00e1 foi claramente estabelecida.<\/p>\n

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Consumo de combust\u00edveis f\u00f3sseis<\/p>\n

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A mecaniza\u00e7\u00e3o do trabalho agr\u00edcola resultou num aumento do consumo de combust\u00edveis f\u00f3sseis nas explora\u00e7\u00f5es agr\u00edcolas, aumentando a contribui\u00e7\u00e3o das mesmas para a altera\u00e7\u00e3o da composi\u00e7\u00e3o da atmosfera, atrav\u00e9s da emiss\u00e3o de CO2<\/sub>.<\/p>\n

Para mais, o uso crescente de combust\u00edveis f\u00f3sseis na produ\u00e7\u00e3o agr\u00edcola, reduziu imenso a efic\u00e1cia energ\u00e9tica das mesmas. Isto \u00e9, os gastos energ\u00e9ticos na produ\u00e7\u00e3o de alimentos est\u00e3o cada vez mais pr\u00f3ximos de ultrapassarem o conte\u00fado energ\u00e9tico contido nos pr\u00f3prios alimentos produzidos. Pretty (1995) calculou que cada Kg de cereais produzidos convencionalmente consome 3-10 MJ de energia, enquanto que a mesma quantidade de cereais pode ser produzida usando entre 0.5-1 MJ usando pr\u00e1ticas agr\u00edcolas menos exigentes em termos de energia.<\/p>\n

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Decl\u00ednio da fertilidade do solo<\/p>\n

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A mecaniza\u00e7\u00e3o agr\u00edcola \u00e9 tamb\u00e9m respons\u00e1vel pela acelera\u00e7\u00e3o da degrada\u00e7\u00e3o do solo. Especialmente a mobiliza\u00e7\u00e3o intensiva do solo provoca eros\u00e3o, ainda mais grave quando associada a precipita\u00e7\u00e3o forte e a falta de vegeta\u00e7\u00e3o que cubra o solo.<\/p>\n

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A eros\u00e3o do solo reduz o conte\u00fado em mat\u00e9ria org\u00e2nica do solo, reduz a disponibilidade de nutrientes para as plantas, reduz a capacidade de reten\u00e7\u00e3o de \u00e1gua do solo e altera a comunidade bi\u00f3tica do solo, levando, em \u00faltima an\u00e1lise, a um decl\u00ednio da fertilidade do solo, que pode chegar at\u00e9 ao ponto da desertifica\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

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O problema da redu\u00e7\u00e3o da fertilidade do solo, associada frequentemente \u00e0 agricultura convencional, \u00e9 particularmente grave, dado que a forma\u00e7\u00e3o do solo tem que ser contada em tempo geol\u00f3gico, levando centenas, se n\u00e3o milhares de anos para ser reposta. No entanto, a fertilidade do solo pode ser destru\u00edda em poucos anos de gest\u00e3o inadequada do solo.<\/p>\n

Nos \u00faltimos 50 anos a gest\u00e3o adequada do solo n\u00e3o era rent\u00e1vel, pois a redu\u00e7\u00e3o da fertilidade do solo, devido \u00e0 eros\u00e3o, p\u00f4de ser superada em grande parte pela aplica\u00e7\u00e3o de fertilizantes sint\u00e9ticos baratos (frequentemente subsidiados, no caso da actual Uni\u00e3o Europeia) (Tietenberg, 2000).<\/p>\n

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Biodiversidade<\/strong><\/p>\n

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A agricultura industrializada \u00e9 considerada uma das maiores amea\u00e7as \u00e0 conserva\u00e7\u00e3o da biodiversidade. A informa\u00e7\u00e3o mais detalhada que existe trata do decl\u00ednio da diversidade e abund\u00e2ncia de aves ao longo da industrializa\u00e7\u00e3o agr\u00edcola. A agricultura industrializada reduz a diversidade da paisagem, pois para que a aquisi\u00e7\u00e3o de m\u00e1quinas seja rent\u00e1vel e o cultivo mais “eficiente” em termos econ\u00f3micos, aumentou-se progressivamente as \u00e1reas homog\u00e9neas, em que apenas um cultivar \u00e9 produzido (monoculturas extensas). A maioria dos animais precisam de habitats diversos para satisfazer as suas diferentes necessidades vitais (esconderijos, \u00e1reas para alimenta\u00e7\u00e3o, etc). Um paul sossegado e limpo n\u00e3o assegura a sobreviv\u00eancia dos patos, se n\u00e3o existem \u00e1reas de pastagem por perto. A agricultura industrializada reduz a diversidade de habitats, leva \u00e0 degrada\u00e7\u00e3o da sua qualidade e \u00e0 sua fragmenta\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

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Bibliografia:<\/strong><\/p>\n

Sedlmayr, A. (2005). Agriculture in Developed Countries: How could it become more sustainable? Essay n\u00e3o publicado, Universidade de Essex.<\/p>\n

Pretty, J. (1998). The Living Land. Agriculture, food and Community Regeneration in Rural Europe. Erathscan, London.<\/p>\n

Tietenberg, (2000). Reproducible Pirvate Property Resources: Agriculture. In Tietenberg, T., Environmental and Natural Resource Economics. 5\u00aa Edi\u00e7\u00e3o, Addison-Wesley, Harlow, England.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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