Julho 2008 – Quercus https://quercus.pt Thu, 04 Mar 2021 17:12:57 +0000 pt-PT hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.2 https://quercus.pt/wp-content/uploads/2021/03/cropped-logotipo-quercus-svg-32x32.png Julho 2008 – Quercus https://quercus.pt 32 32 Refinaria na Extremadura Espanhola é ambientalmente prejudicial para Portugal e Espanha https://quercus.pt/2021/03/04/refinaria-na-extremadura-espanhola-e-ambientalmente-prejudicial-para-portugal-e-espanha/ Thu, 04 Mar 2021 17:12:57 +0000 https://quercus.pt/?p=12551 A Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, o GEOTA – Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente, a LPN – Liga para a Protecção da Natureza e o FAPAS – Fundo para a Protecção dos Animais Selvagens (organizações não governamentais portuguesas), bem como a ADENEX – Asociación para la Defensa de la Naturaleza y los Recursos de Extremadura e a Plataforma Cidadã Refinaria Não, apelam aos Governos Português e Espanhol que tomem a decisão de não autorizar a construção de uma refinaria de petróleo na província de Badajoz, devido aos consequentes impactes ambientais negativos que se prevêem vir a existir para ambos os países.

 

O período de consulta pública do estudo de impacte ambiental está prestes a terminar em Espanha e não é clara a forma como a participação pública portuguesa pode ser exercida. Na opinião das organizações subscritoras, o processo de participação pública, que em Espanha foi muito deficiente, não deu a oportunidade real de conhecer adequadamente o projecto, nem permitiu que os cidadãos portugueses, afectados e implicados de modo directo no mesmo, se manifestassem de forma conveniente.

 

Do ponto de vista económico, o investimento numa nova refinaria, na localização prevista, não tem sentido por diversas razões, nomeadamente:

 

O petróleo é um recurso cada vez mais escasso e portanto, trata-se de um investimento de raiz que tem um curto período de duração e elevados custos de desmantelamento, sendo para além disso, contrário ao objectivo de menor dependência energética de combustíveis fósseis e de acção contra as alterações climáticas;

 

No âmbito da União Europeia, a tendência é para uma redução do número de refinarias, passando pela modernização de algumas delas mas não pela construção de novas unidades;

 

Nos países que têm áreas costeiras, as refinarias localizam-se no litoral (Sines, Matosinhos, Huelva, Cartagena, Tarragona..) e/ou junto de grandes cidades ou pólos industriais. A localização na Extremadura Espanhola é anacrónica, pois exigiria a construção de um oleoduto com mais de 200 km e outras infraestruturas associadas de captação e depuração de águas, efluentes, etc., cujos impactes ambientais negativos são muito mais significativos pela não proximidade de mar;

 

 

Do ponto de vista ambiental, os impactes desta refinaria seriam extremamente graves, nomeadamente:

 

A construção da refinaria teria lugar na bacia hidrográfica do Guadiana, a escassos 50 km da albufeira do Alqueva, agravando a situação, já de si preocupante, da qualidade da água, com reflexos negativos no abastecimento doméstico e no regadio e com a consequente contaminação dos aquíferos e do solo. Apesar das actividades nas bacias hidrográficas luso-espanholas ser regulada pela Convenção sobre Cooperação para a Protecção e o Aproveitamento Sustentável das Águas das Bacias Hidrográficas Luso-espanholas (Convenção de Albufeira), e de Portugal, como provável receptor de impactos transfronteiriços ter o direito de participar nas consultas públicas, até ao momento, os mecanismos de participação pública não foram accionados devido ao procedimento irregular do Governo de Espanha;

 

Espanha apresenta o maior nível de incumprimento do Protocolo de Quioto na União Europeia e uma instalação desta natureza tem emissões muito consideráveis de dióxido de carbono, contribuindo significativamente para a emissão de gases de efeito de estufa causadores das alterações climáticas, indo contra uma política energética de maior aposta na eficiência energética e nas energias renováveis, em detrimento do uso de combustíveis fósseis;

 

As emissões atmosféricas associadas a outros poluentes serão muito relevantes, com efeitos na saúde pública e nos ecossistemas, contribuindo para problemas como a acidificação, a produção de ozono troposférico e ainda a emissão de partículas. Em determinadas condições meteorológicas, Portugal será directamente afectado;

 

A produção de resíduos perigosos é muito importante e obrigará, não apenas ao seu tratamento, como a operações de descontaminação, isto para além das acções de desmantelamento no futuro;

 

Serão inevitáveis os impactos sobre a importante actividade agrícola na zona, a paisagem e os ecossistemas circundantes (Serra de San Jorge), para além dos valores de património histórico e cultural como a Via de la Plata – Camino de Santiago, exactamente na zona de implantação do empreendimento;

 

Em termos sociais, há opções de desenvolvimento muito preferíveis e sustentáveis:

 

O investimento a efectuar na refinaria, a ser aplicado em energias renováveis, geraria um muito maior número de postos de trabalho directo (cerca de 10 mil);

 

O futuro da bacia hidrográfica do Guadiana passa por um desenvolvimento que promova as potencialidades locais e não a criação de conflitos sociais que uma instalação desta natureza criará inevitavelmente.

 

As organizações não governamentais de ambiente ibéricas subscritoras esperam que o Governo Português e Espanhol cumpram a sua obrigação e se oponham a este projecto nocivo ao Ambiente e à saúde pública que compromete o desenvolvimento sustentável de ambos os países.

 

 

Lisboa / Mérida, 17 de Julho de 2008

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Energia: A fuga em frente https://quercus.pt/2021/03/04/energia-a-fuga-em-frente/ Thu, 04 Mar 2021 17:12:51 +0000 https://quercus.pt/?p=12550 A subida do preço do petróleo continua a ser o grande incentivo à poupança e eficiência energética, assim como às energias renováveis. A redução do consumo de combustíveis nos últimos tempos e o crescimento de apenas 1% no consumo de energia eléctrica nos primeiros seis meses de 2008 assim o demonstram.

 

 

Hélder Spínola*

 

 

No entanto, os constrangimentos que dificultam uma libertação progressiva dos combustíveis fósseis continuam muito fortes e a própria procura de alternativas ao petróleo continua refém da mesma filosofia que sempre esteve subjacente à dependência do petróleo: aumento do consumo, produção centralizada e dependência de uma única fonte.

 

Apesar da política energética em Portugal necessitar seguir uma lógica diferente, apostada na poupança e eficiência energética assim como no aproveitamento diversificado e extensivo de energias renováveis, continua a sonhar com os grandes projectos de produção de energia. São disso exemplo o Programa Nacional de Barragens e a ideia recorrente de alguns em construir um central nuclear em Portugal. A poupança e a eficiência energética continuam a não merecer a atenção necessária dos governos e empresas, apesar das suas enormes potencialidades.

No último ano, só em resposta ao custo acrescido do petróleo, a sociedade prometeu alguma esperança reduzindo o crescimento nos consumos. Se os governos souberem responder a este desafio, apostando a sério na poupança e eficiência energética e no aproveitamento sustentável, diversificado e extensivo das energias renováveis, os portugueses e as empresas saberão responder à altura.

 

No entanto, enquanto nos deixarmos levar pela inércia e mantermos a “fuga em frente” dificilmente teremos esses resultados tão almejados.

 

 

  • Presidente da Direcção Nacional da Quercus
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Quercus e GEOTA contra exploração de caulinos em Vila Seca, Barcelos https://quercus.pt/2021/03/04/quercus-e-geota-contra-exploracao-de-caulinos-em-vila-seca-barcelos/ Thu, 04 Mar 2021 17:12:44 +0000 https://quercus.pt/?p=12549 A avaliação da situação por parte da QUERCUS – Associação Nacional de Conservação da Natureza e do GEOTA – Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente tem como base a ampla documentação disponibilizada pelo Presidente da Junta de Freguesia de Vila Seca.

 

Foram consultados os pareceres de Manuel Abrunhosa nos domínios da geologia mineira, hidrologia e hidrogeologia, e de Luís Oliveira nos domínios da biologia e paisagem.

A Quercus e o GEOTA tiveram ainda em conta a Providência Cautelar e a Acção Judicial apresentadas ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga pela Câmara Municipal de Barcelos, bem como a abundante informação relativa ao “histórico” do processo, incluindo alguns elementos técnicos respeitantes ao pedido de concessão da exploração, para além de visita prévia ao terreno.

 

Súmula histórica

 

a)      A exploração de caulino é efectuada há várias décadas na freguesia vizinha de Barqueiros pela mesma empresa que obteve o contrato de concessão em Gandra, esta empresa pretendeu fazer valer os direitos que detém sobre o jazigo de PRESTARE, no centro da freguesia, o que provocou tumultos com a população com consequências trágicas. Em 1990 a empresa, o governo e a Junta de Freguesia de Barqueiros assinaram um documento que impôs a suspensão da exploração do Jazigo de PRESTARE, em troca de uma indemnização à MIBAL no valor de 50.000 contos.

 

b)      Na sequência, a MIBAL solicitou o acesso a áreas alternativas, nomeadamente a designada por Gandra. Porém, o PDM de Barcelos, ratificado em reunião de Conselho de Ministros em 25 de Maio de 1995, exclui da vocação extractiva todas as áreas não cobertas por direitos de exploração à data da sua elaboração, inviabilizando o acesso a novas áreas, incluindo a de Gandra, a qual se encontra maioritariamente integrada em Espaço Agrícola, abrangida pelas condicionantes RAN e REN (conforme pode ser verificado nas plantas de Ordenamento e Condicionantes do PDM).

 

c)      Não obstante, o Instituto Geológico e Mineiro, em Aviso datado de 28 de Abril de 2000, faz público o requerimento pela MIBAL da celebração de contrato de concessão de exploração de caulino em Gandra. Na sequência a Câmara Municipal de Barcelos emite, em 13 de Junho de 2000, parecer negativo com base na ausência de enquadramento legal conferido pelo PDM e na convicção de que “a existência da exploração trará impactes negativos ao nível das acessibilidades, segurança dos alunos da Escola EB2,3 – Dr. Abel Varzim, destruição de solos agrícolas e alteração do regime hidrológico”, acrescentando que “a manter-se o comportamento da MIBAL –MINAS DE BARQUEIROS, S.A., enquanto concessionária da exploração de caulinos na freguesia de Barqueiros, não há garantias de que a lei será integralmente cumprida, nomeadamente no que se refere às questões ambientais”.

 

d)      Decorridos mais de seis anos, em resposta a solicitação da Direcção Geral de Geologia e Energia (DGGE), que informa em 3 de Agosto de 2006 estar a concluir a proposta de atribuição de concessão “Gandra”, o parecer negativo da CMB de 13/06/2000 é confirmado em 6 de Outubro de 2006, mais se informando que continua em vigor o PDM ratificado em 25 de Maio de 1995.

 

e)      Passado mais um ano, e sem que tivesse havido quaisquer outros contactos com o poder local, a DGGE faz publicar em Diário da República, 2ª série, nº 176, de 12 de Setembro de 2007, Anúncio (extracto) nº 6058/2007 relativo ao contrato de concessão de exploração de caulino de Gandra, correspondendo a uma área de 41,925 ha. A concessão é dada por um período inicial de 15 anos, com a possibilidade de prorrogação de 10+10 anos, podendo, no fim desse prazo (35 anos) dar ainda lugar a um novo contrato “caso o jazigo continue a ter valor industrial”. Nos termos do contrato o concessionário fica obrigado a uma caução no valor de 75.000 euros, bem como a pagar à DGGE, como encargo de exploração, 3% sobre o valor à boca da mina dos produtos mineiros.

 

  1.       Dois dias depois, em 14 de Setembro de 2007, a CMB aprova em reunião de câmara, por unanimidade, uma moção contra a concessão (ratificada em Assembleia Municipal, uma semana depois). Após vários meses de contactos infrutíferos com diversas entidades, incluindo a DGGE e sem que se tenha chegado a qualquer espécie de acordo, a CMB anuncia a entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga de uma

 

Providência Cautelar e Acção Judicial contra a concessão por violação do PDM e ainda com base nos seguintes considerandos:

 

a.      Ausência de confirmação da existência de caulino por parte da DDGE.

 

b.      Presunção de que a diminuta percentagem de caulino branco (6%) não será o verdadeiro interesse da MIBAL mas sim a exploração de areias, que não é um bem do domínio público concessionável.

 

c.       Ausência de procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental sobre os 42 ha da concessão.

 

d.      Dispensa de cumprimento da recuperação paisagística com reposição das areias, a pretexto da criação de um lago para fins lúdicos e rega.

 

e.      Inexistência de desafectação do espaço RAN e REN.

 

Da concessão

 

Em Portugal o regime jurídico geral da revelação e aproveitamento dos recursos geológicos está sujeito à disciplina imposta pelo Decreto-Lei nº 90/90, de 16 de Março. Considerando a diversidade de características dos diferentes recursos geológicos, das técnicas do seu aproveitamento e das implicações decorrentes da sua exploração, particularmente nas situações de potencial conflito com outros utilizadores do solo e subsolo, optou-se por enquadramentos jurídicos específicos para cada tipo de recurso, tendo, na ocasião, sido produzido um pacote legislativo completo para o conjunto dos recursos geológicos.

De acordo com a legislação então produzida integram-se no domínio público do Estado, entre outros recursos geológicos, os depósitos minerais, definidos como “as ocorrências minerais existentes em território nacional e nos fundos marinhos da zona económica exclusiva que, pela sua raridade, alto valor específico ou importância na aplicação em processos industriais das substâncias nelas contidas, se apresentam de especial interesse para a economia nacional” e regulados pelo Decreto-Lei nº 88/90, de 16 de Março.

 

Os depósitos minerais, por se integrarem no domínio público do Estado, são objecto de concessão. Em oposição, as rochas e ocorrências minerais não qualificadas legalmente como depósitos minerais, e designadas de massas minerais, não se integram no domínio público do Estado, (Decreto-Lei nº 89/90 de 16-03 revogado por Decreto-Lei nº 270/2001 de 06-10 alterado por Decreto-Lei nº 340/2007 de 12-10), sendo por isso objecto de licença de estabelecimento.

 

O caulino é uma das ocorrências minerais que se pode enquadrar na definição de depósito mineral, embora não se caracterize pela sua raridade em Portugal. Ao contrário, e como refere Abrunhosa (2007), “as reservas existentes em Portugal são muito elevadas e têm a capacidade de satisfazer o mercado nacional” inclusive nas “aplicações mais exigentes”. O facto de o país importar caulino deve-se, segundo o mesmo autor, aos “custos relativamente baixos desta matéria-prima no mercado internacional” e à “forte agressividade exportadora” de países como os EUA, Brasil e Itália (op. cit.)

Porém, ainda que se conceda que o caulino possa ser classificado de depósito mineral, a atribuição da concessão deve pressupor a revelação da existência do recurso, o que, no caso vertente, como se verá seguidamente, não foi claramente provado, nem pelo concessionário, nem muito menos pela DGGE. Com efeito, dadas as características de ocorrência do caulino no concelho de Barcelos e em concelhos limítrofes, “em depósitos sedimentares de composição detrítica que representam restos de antigos leitos fluviais – aluviões – ou de praias marinhas (…) formados dominantemente por camadas de areia e cascalheira, com mais ou menos finos de impregnação (onde está presente algum caulino) e também com algumas camadas dominantemente compostas por materiais finos onde o caulino se concentra naturalmente” (Abrunhosa, 2007) forçoso se torna realizar trabalhos de prospecção e laboratoriais tendo em vista determinar o teor de caulino e avaliar as reservas, isto é, fazer prova do seu valor económico de forma a que a ocorrência possa ser efectivamente qualificada de depósito mineral, em face da sua “raridade, alto valor específico”, etc.

 

Da escassa informação técnica disponibilizada pela DGGE pode concluir-se que, segundo a Memória Descritiva da actualização do Plano de Lavra efectuada pela MIBAL para o pedido de concessão da mina de caulino “Gandra”, com data de Outubro de 1999, o jazigo possuirá:

 

20% de caulino, sendo 6% de caulino branco, com aplicação em cerâmica fina e 14% de caulino amarelo, de aplicação na indústria de agroquímicos e borracha.

70% de areias, sendo areias brancas especiais, calibradas, com aplicação em filtros e estações de tratamento de água e areias amarelas para a construção civil e obras públicas.

 

10% de estéril.

 

Refira-se que os valores que são avançados pela MIBAL apoiar-se-ão em determinações presumivelmente realizadas num número reduzido de amostras (quatro? não foi possível ter acesso aos boletins de análise), colhidas em local indeterminado (não é apresentada cartografia e, alegadamente, o local foi posteriormente “invadido” por exploradores clandestinos, não sendo por isso passível de confirmação).

Estudos posteriores, efectuados no local por Abrunhosa (2007), apoiados por sondagens com comprimentos totais de 33,4m, permitiram a avaliação de teores médios de argila de 9%. Mesmo fazendo corresponder os teores totais de argila a teores de caulino – o que corresponderia a um cenário demasiado optimista – estar-se-ia longe dos 20% indicados pela MIBAL. Revelador é ainda o facto de, nos estudos referidos, se ter obtido um teor médio de areia e seixo de 79.4% (sendo os restantes 11, 9% correspondentes à fracção silte).

 

Do estudo apresentado pela MIBAL fica a ideia que a própria empresa atribui a este jazigo um valor económico marginal, designadamente quando refere que “a matéria-prima é bastante mais pobre, originando um coeficiente de aproveitamento inferior” (quando comparado com a Quinta da Antónia); que a “qualidade do produto será inferior à da Quinta da Antónia mas suficiente, contudo, para a sua utilização em cerâmica, borracha, filtros para tratamento de água e construção civil”; e que “a concessão funcionará como reserva alternativa à Quinta da Antónia, dependendo a produção de eventuais estrangulamentos desta e das oscilações de procura no mercado”.

 

É ainda interessante verificar que, segundo a MIBAL, a produção justificar-se-á pelo facto de os factores económicos e financeiros não serem relevantes: praticamente não gerará emprego (apenas 1-2 postos de trabalho), não estando previsto qualquer tipo de investimento no local, funcionando apenas como uma “almofada” (sic) em termos comerciais.

 

Outro dado curioso resulta da análise da previsão das receitas anuais, que coloca o item areias especiais como o gerador de maior receita (141 680 contos), seguido do caulino branco (110 880 contos) e finalmente do caulino amarelo (apenas 61 900 contos).

 

Ainda que se considerasse a presumível existência de caulino na percentagem indicada pela empresa – 20% (sendo que apenas 6% seria de elevada qualidade) – não há dúvida que, quer do ponto de vista do interesse económico (realização de receitas), quer do ponto de vista da natureza dos materiais exploráveis (maioritariamente areias), parece lícito concluir que a principal razão de ser da exploração objecto de concessão em Gandra é, paradoxalmente, não o caulino mas as areias, precisamente a parte da jazida que não constitui matéria concessível e que pertence ao domínio privado.

 

Esta conclusão é reforçada pela observação de Abrunhosa (2007) que refere que “as areias são o único produto mineral não combustível e não metálico de que Portugal é, e muito, deficitário na oferta. Este facto conduz a preços altos e a uma procura de origens alternativas, incluindo algumas que denotam assinalável criatividade da indústria”.

 

A ser assim estar-se-ia perante um expediente de legitimidade muito questionável que consistiria em atribuir uma concessão a pretexto da ocorrência (praticamente vestigial) dum depósito mineral concessível (o caulino) de rendibilidade económica duvidosa, de forma a chegar à exploração de uma massa mineral não concessível (as areias), essa sim altamente lucrativa, sem ter de se sujeitar a negociações com os proprietários dos terrenos da Gandra.

 

Sublinhe-se que tudo isto está a ser possível com a conivência do Estado, nomeadamente a Direcção Geral de Energia e Geologia (DGEG, ex-DGGE) que se demitiu, no caso vertente, das suas funções de regulação e fiscalização dos recursos geológicos, nomeadamente da sua identificação e exploração com vista à sua valorização e utilização apropriada, conforme consta das competências que lhe são atribuídas pelo Decreto-Lei nº 139/2007 de 27 de Abril.

 

Do impacte ambiental

 

A actividade extractiva é reconhecidamente geradora de impactes ambientais negativos e como tal considerada no Decreto-Lei nº 69/2000, de 3 de Maio, relativo à avaliação do impacte ambiental (AIA) dos projectos públicos e privados susceptíveis de produzirem efeitos significativos no ambiente, e que transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva nº 97/11/CE, do Conselho, de 3 de Março; recentemente alterado pelo Decreto-Lei nº 197/2005 de 8 de Novembro, transpondo parcialmente para a ordem jurídica interna a Directiva nº 2003/35/CE do Conselho, de 26 de Maio, relativa à participação pública na elaboração de planos e programas relativos ao ambiente. O regime jurídico estabelecido pelo referido diploma é ainda complementado pela regulamentação dos estudos de impacte ambiental foi efectuada pela Portaria n.º 330/2001, de 2 de Abril.

 

Assim, todas as explorações a céu aberto que tenham área superior a 5 ha ou produzam mais de 150.000 toneladas por ano estão sujeitas a avaliação de impacte ambiental.

A concessão da mina de caulino de Gandra corresponde, como se referiu anteriormente, a uma área de 41,925 ha. Porém, o concessionário decidiu apresentar como área de exploração inicial uma parcela que, de acordo com a DGGE, será de 2,6 ha (segundo ofício de 06/11/07 ao Governador Civil do Distrito de Braga) ou de 4 ha (segundo comunicação da mesma entidade à QUERCUS em ofício de 16/11/07), em todo o caso aparentemente inferior aos 5 ha previstos na legislação aplicável. Independentemente do facto de a própria entidade reguladora não saber ao certo a área de exploração que o concessionário pretende explorar (o que é deplorável!), resulta claro que se usa, mais uma vez, um expediente grosseiro para contornar a lei, dado que, como é evidente, a concessão de cerca de 42 ha nunca teria sido atribuída se o objectivo fosse o de, declaradamente, explorar menos de 10% da área concessionada. Nem do ponto de vista geológico, nem tecnológico se justifica qualquer tipo de diferenciação, porquanto a natureza da jazida é idêntica em toda a área concessionada, assim como o são as técnicas de exploração a empregar. No limite poder-se-ia admitir que qualquer explorador se eximiria de se submeter a avaliação de impacte ambiental desde que dividisse a sua concessão em sucessivas áreas descontínuas, sempre inferiores a 5 ha.

 

Tal prática, por conveniente a qualquer operador, não foi por certo ideia exclusiva da MIBAL, sendo que, inclusivamente, ao nível da aplicação da Directiva de Impacte Ambiental no espaço da União Europeia já se designou tal esta prática ou “moda” de fragmentação dos projectos, de modo a evitar ao regime de AIA, de salami-slicing, tendo já sido reconhecido como um problema a nível de diversos Estados-membros, na Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho COM/2003/0334.

 

A dispensa de AIA em caso de segmentação dos projectos, é contrária à Lei, que obriga que o Estudo de Impacte Ambiental tenha em conta os efeitos cumulativos relativamente a outros projectos (Anexo V, n.º 1, do Decreto-Lei nº 69/2000), pelo que se os efeitos cumulativos têm de ser atendidos quando há outros projectos conjuntamente com os quais podem potenciar impactes ambientais negativos, mais ainda quando se trata do mesmo projecto, apenas fraccionado. Mais que tudo, o que fica posto em causa é em nosso entender o espírito da Lei, que pretende que potenciais impactes ambientais sejam avaliados, independentemente das formalidades dos projectos, e das medidas falaciosas de fragmentação que ambicionam torná-los inócuos, e isentos de qualquer impacte (ou necessidade de avaliação de impacte) na área de localização.

 

Por outro lado, é preciso não esquecer que, ao não se ter procedido à AIA, se privou a população local, que vai sofrer diversas consequências negativas com a execução deste projecto, da devida participação pública, que mais grave se torna, quando o PDM (instrumento cuja elaboração também conta com a participação pública), prevê destinos muito diferentes para os terrenos em questão.

Atente-se então aos impactes ambientais susceptíveis de serem produzidos por esta acção.

 

Em primeiro lugar haverá que ter conta as características do meio que iria ser afectado, das quais se enumeram algumas das mais importantes:

 

a)      Meio rural, mas com densidade populacional bastante elevada (2 a 3 vezes superior à média nacional) e, ao mesmo tempo, com um padrão de povoamento disperso, o que leva a que qualquer exploração tenha, inevitavelmente, que conflituar com vizinhos, quer em termos de impactes directos (ruído, poeiras, vibrações, etc) quer indirectos (transportes pesados).

 

b)      Extensas áreas agrícolas e florestais, em grande parte coincidentes com condicionantes de ordenamento do território, como RAN e REN.

 

c)      Rede hidrográfica densa, convergente na ribeira de Milhazes, complementada por numerosas nascentes.

 

d)      Aquífero local bastante produtivo, com uma superfície freática muito elevada, o que favorece, quer a sua utilização para as actividades económicas tradicionais através de poços pouco profundos (rega, abeberamento de gado, etc.), quer as funções ecológicas.

 

e)      Solos melhorados ao longo de práticas agrícolas ancestrais de fertilização e rega.

 

f)       Património arqueológico relevante.

 

Em segundo lugar convirá sublinhar alguns dos impactes que, previsivelmente, poderão afectar de forma significativa as características do meio:

 

a)      Alterações topográficas irreversíveis (a empresa já declarou a sua intenção de não proceder ao enchimento da corta, a pretexto de uso futuro como depósito de água) e de elevada magnitude (poderão atingir duas dezenas de metros).

 

b)      Produção de poeiras, gases, vibrações e resíduos industriais com afectação previsível das populações mais próximas e respectivas actividades e da vida animal e vegetal.

 

c)      Alteração drástica do uso do solo com destruição de horizontes com funções económicas e ecológicas.

 

d)      Afectação da rede hidrográfica superficial e subterrânea, com alteração de cursos de água, destruição e esgotamento de nascentes e rebaixamento drástico da superfície freática (que poderá atingir mais de dez metros de profundidade e áreas de dezenas de hectares) com importantes consequências económicas, sociais e ambientais.

 

e)      Afectação da qualidade da água superficial e subterrânea, com introdução de substâncias poluentes geradas na actividade extractiva (óleos, metais pesados, etc.).

 

f)       Afectação significativa de flora e fauna, quer de forma directa, com destruição de habitats, quer de forma indirecta, através da afectação dos recursos anteriormente mencionados (solo, água, ar, etc.)

 

g)      Diminuição da qualidade visual e do valor cultural da paisagem

 

h)      Afectação de património arqueológico, arquitectónico e etnológico e da qualidade de vida das populações, nomeadamente através da ocupação de uma área que actualmente tem funções lúdicas.

 

i)        Aumento da insegurança, pela criação de amplas crateras e circulação de maquinaria e transportes pesados.

Em terceiro lugar, e caso se viesse a verificar a pretendida exploração, importa referir a elevada probabilidade de a empresa não vir a proceder às necessárias medidas de minimização, atendendo à sua prática continuada de se eximir às responsabilidades sociais e ambientais, como está bem patente na forma como conduz as explorações na vizinha freguesia de Barqueiros (como foi dado observar na visita ao terreno efectuada em 10/06/08).

 

Em síntese:

 

a)      Deficientes medidas de segurança destinadas a prevenir acidentes de trabalhadores e população (de que são exemplo as vedações destruídas pela própria empresa em trabalhos de “manutenção” das lagoas de decantação na Quinta da Antónia).

 

b)      Inexistência generalizada de medidas de recuperação das áreas esgotadas ou, nas raras situações em que ocorre acções de enchimento parcial, utilização de materiais não inertes (entulhos contaminados) para preenchimento de áreas esgotadas.

 

c)      Ausência quase total de medidas de recuperação do solo afectado, nomeadamente o não aproveitamento da camada de terra arável saneada nas áreas exploradas, a qual deveria ser armazenada em pargas com o objectivo de ser reutilizada no revestimento e suporte de cobertura vegetal dos taludes.

 

d)      Taludes de corta instáveis, sem a adequada inclinação, e muito menos sem revestimento vegetal ou drenagem.

 

e)      Afectação de linhas de água, com entulhamento dos cursos de água e concentrações elevadas de sólidos em suspensão e ausência de monitorização dos poços afectados e da superfície freática e de medidas de compensação.

 

f)       Ausência quase total de criação de cortinas arbóreas com funções de amenização do ruído e poeiras, ou de quaisquer outras medidas destinadas a minimizar os impactes directos sobre as populações e o ambiente.

 

g)      Inexistência de medidas de integração paisagística das explorações.

Pelas razões apontadas conclui-se, sem qualquer dúvida, que a intenção de proceder à exploração de caulino em Gandra deveria ser precedida de avaliação de impacte ambiental tendo por base a área da concessão.

 

Conclusões

 

A sociedade precisa dos recursos geológicos para o seu desenvolvimento económico. Mas é necessário que esse desenvolvimento se faça de forma sustentável, isto é, “que vá ao encontro das necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações poderem dar resposta às suas” (Relatório Brundtland). Como afirma Abrunhosa (2007): “A exploração de recursos minerais é essencial para a economia e desenvolvimento das nações e terá de o ser também para o das regiões em que se insere. Corresponde à valorização de recursos endógenos que nada fizemos para criar, mas que devemos fazer tudo para, ou preservar para as gerações vindouras como um capital a acumular juros, ou explorar com a máxima rentabilidade da comunidade e das empresas envolvidas, no respeito pelas técnicas e pela legislação ambiental. E também no respeito pelas opções da populações que possam ser, de alguma forma, interessadas ou afectadas. A exploração mineira não pode contribuir para o pesado passivo ambiental que criou noutros tempos, nem para ser foco de conflitualidade social”.

No que a Gandra se refere está-se perante um projecto de rendibilidade económica mais do que duvidosa, se se trata de explorar o caulino, ou de uma fraude lesiva dos interesses legítimos dos proprietários, se a coberto do pretexto do caulino, se quer insistir na lavra ambiciosa das areias e cascalho, inviabilizando a recuperação ambiental da exploração. Em todo o caso, sem que se verifique fundamento técnico e legal para a atribuição da concessão, já que carece de demonstração a existência de teores significativos de um minério alegadamente caracterizado pela sua raridade e elevado valor específico.

Afastado o interesse nacional, o que resta? Certamente, não o interesse regional ou local, provada que está, à saciedade, a oposição das populações e dos seus legítimos representantes do poder local, e pesados que sejam os significativos impactes ambientais, económicos e sociais que a exploração provocaria.

Resta, naturalmente, o interesse egoísta de uma empresa que, em mais de quarenta anos de actividade, não soube criar emprego significativo nem riqueza para a região em que se insere e que lega para as gerações futuras a pesada herança de recuperar largos hectares de terreno esventrado. E, não menos importante, a intolerável cumplicidade de uma administração pública que, em vez de zelar pela valorização e utilização apropriada dos recursos que estão sobre a sua alçada, opta por compactuar com processos ínvios que conduzem à apropriação ilícita de recursos insusceptíveis de serem classificados no domínio público.

 

 

Vila Seca, 23 de Julho de 2008

 

 

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Abate Ilegal de Sobreiros em REN no Pinhal Novo https://quercus.pt/2021/03/04/abate-ilegal-de-sobreiros-em-ren-no-pinhal-novo/ Thu, 04 Mar 2021 17:12:38 +0000 https://quercus.pt/?p=12548 Abate Ilegal de Sobreiros em REN no Pinhal Novo | Quercus exige a reposição do montado

 

A Quercus teve recentemente conhecimento de um abate ilegal de sobreiros existentes nos terrenos da antiga Herdade do Monte Novo, actualmente da Sociedade Agrícola do Pinhal Novo, junto da empresa Concremat, no Pinhal Novo, concelho de Palmela.

 

Segundo apurámos, o referido abate ocorreu em área de povoamento de sobreiros, em REN – Reserva Ecológica Nacional e também em RAN – Reserva Agrícola Nacional, onde existiu movimentação de terras e extracção de inertes sem autorização, situação que foi denunciada às autoridades através do SOS Ambiente e Território em 22/11/07, com registo de processo n.º 4137/07. Após a fiscalização do Serviço de Protecção da Natureza e Ambiente da GNR, a 11/02/08 já não foram detectados vestígios de abate de sobreiros no local, tendo apenas sido levantado um auto de notícia por movimentação de terras e extracção de inertes em REN sem autorização, o qual foi remetido para a Câmara Municipal de Palmela, para instrução de processo de contra-ordenação.

 

A Quercus lamenta a morosidade da actuação que retirou a eficácia na responsabilização do abate ilegal de sobreiros.

 

Na visita ao local verificámos a mobilização de solos em área da REN onde foram abatidos centenas de sobreiros existindo árvores de grande porte e algumas mais pequenas, o que se pode constatar pela análise comparativa da fotografia aérea do local.

 

Dado que o abate de sobreiros em povoamento foi efectuado ilegalmente, sem ter existido uma actuação eficaz da Direcção-Geral dos Recursos Florestais por não ter tido acesso à informação da denúncia, a Quercus exige o apuramento da infracção pelos serviços competentes, para que exista o cumprimento integral da legislação com a interdição da alteração do uso do solo e reposição da floresta de sobreiros.

 

A Quercus vai continuar a acompanhar este processo, esperando que a Administração actue em conformidade para repor a legalidade.

 

 

Lisboa, 25 de Julho de 2008

 

A Direcção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza

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Ria de Alvor | Decisão da Justiça Incentiva a Luta pela Conservação da Natureza em Portugal https://quercus.pt/2021/03/04/ria-de-alvor-decisao-da-justica-incentiva-a-luta-pela-conservacao-da-natureza-em-portugal/ Thu, 04 Mar 2021 17:12:30 +0000 https://quercus.pt/?p=12547 O Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé deu provimento à providência cautelar interposta pela Associação A Rocha para travar as ilegalidades que têm vindo a ser cometidas na Quinta da Rocha.

 

Trata‐se  de  uma  decisão  histórica  em  termos  de  jurisprudência  ambiental,  uma  vez  que  vem  proibir  um  acto  continuado  de  destruição  e  não  uma  decisão  administrativa  ilegal,  como  usualmente  acontece.

 

Desde  a  Primavera  de  2005,  que  os  novos  proprietários  da  Quinta  da  Rocha  têm  vindo  a  ordenar  intervenções  que  resultaram  em  enormes  danos  ambientais  numazona  protegida  pelos  mais  elevados  estatutos  de  protecção  ambiental,  nacionais  e  comunitários.  Destas  intervenções  resultaram  a  destruição  de  espécies  e  habitats  prioritários,  a  destruição  completa  de  um  sapal  com  habitats  protegidos,  a  remoção  selectiva  de  bioindicadores  de  habitats  protegidos  e  ainda  um  enrocamento  não  autorizado  em  zona  costeira.

 

Com  esta  providência  cautelar,  os  proprietários  ficam  agora  proibidos  pelo  tribunal  de  reiniciar  qualquer  tipo  de  actividade,  obra  ou  trabalho  nas  áreas  onde  se  encontram  espécies  protegidas,  ou  com  incidência  nessas  áreas,  sob  pena  de  incorrerem  em  crime  de  desobediência.

 

O  Grupo  de  Acompanhamento  da  Ria  de  Alvor  receia  que  os  danos  ambientais  até  agora  perpetrados  possam  fazer  parte  de  uma  estratgia  para  remover  os  constrangimentos  impostos  pela  legislação  ambiental,  abrindo  assim  caminho  para  a  urbanização  dos  terrenos  há  muito  desejada.

 

Recorrendo  a  este  tipo  de  expedientes,  os  infractores  são,  na  maioria  dos  casos,  apenas  condenados  ao  pagamento  de  pequenas  coimas,  insignificantes  quando  comparadas  com  os  lucros  astronómicos  que  se  podem  obter  quando  um  terreno  perde  o  seu  estatuto  de  protcção  ambiental,  por  já  não  existirem  as  espécies  e  habitats  que  o  justificavam.

 

Assim,  o  Grupo  de  Acompanhamento  da  Ria  de  Alvor  avançou  no  mês  passado  com  uma  acção  no  Tribunal  Administrativo  e  Fiscal  de  Loulé,  pedindo  a  única  medida  capaz  de  travar  o  avanço  inexorável  da  construção  em  detrimento  das  zonas  protegidas:  a  condenação  da  empresa  proprietária  à  reposição  de  todos  os  habitats  destruídos.

 

Grupo de Acompanhamento da Ria de Alvor

 

A Rocha (Associação Cristã de Estudo e Defesa do Ambiente), Almargem (Associação de Defesa do Património Cultural e Ambiental do Algarve), GEOTA (Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente), LPN (Liga para a Protecção da Natureza), Quercus (Associação Nacional de Conservação da Natureza) e SPEA (Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves).

 

 

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Dia Nacional da Conservação da Natureza | Pouco há a comemorar https://quercus.pt/2021/03/04/dia-nacional-da-conservacao-da-natureza-pouco-ha-a-comemorar/ Thu, 04 Mar 2021 17:12:24 +0000 https://quercus.pt/?p=12546 Amanhã, 28 de Julho, é o Dia Nacional para a Conservação da Natureza mas pouco há a comemorar.Sinais contraditórios, omissões e uma clara falta de empenho dos governos assinalam vários anos de oportunidades perdidas que têm descredibilizado a política de conservação da natureza em Portugal. A Quercus aproveita a data para relembrar algumas das situações que contribuem para este fracasso.

 

# Falta de Planos de Acção para a Fauna e a Flora Criticamente em Perigo

 

Numa altura em que o Plano de Acção para o Lince-ibérico avança com grande atraso e de forma perigosamente lenta, outros Planos de Acção aguardam algum movimento da Autoridade Nacional de Conservação da Natureza. De facto, 13 espécies de aves, 9 de mamíferos, 8 espécies de peixes, e, pelo menos, 5 espécies da flora estão criticamente em perigo e necessitam de medidas urgentes de conservação. O Abutre do Egipto, a Boga do Oeste ou o Trevo-de-quatro-folhas são algumas das espécies que requerem uma intervenção imediata com base em estratégias de acção aprovadas.

 

# Rede Natura 2000 abandonada

 

Numa altura em que é publicado o Plano Sectorial da Rede Natura 2000, as Zonas de Protecção Especial para as Aves e as Zonas Especiais de Conservação (os chamados “Sítios”), continuam sem monitorização, sem vigilância e sem quaisquer medidas de conservação activa. À semelhança do que já aconteceu durante a discussão do agora aprovado documento, a Quercus continua a propor uma profunda revisão do mesmo e uma profunda reavaliação dos limites das ZPE’s e das ZEC’s com base nos resultados da urgente elaboração do Cadastro dos valores naturais, o qual está previsto no recém-publicado Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade.

 

# Rede Nacional de Alimentadores de Abutres por implementar

 

A conservação das aves necrófagas através da implementação de uma rede nacional de alimentadores, 18 anos após a publicação da legislação que define as normas para o licenciamento e gestão de campos de alimentação, continua sem qualquer estratégia. A situação está a tornar-se mais complicada e insustentável à medida que a disponibilidade alimentar diminui, em parte devido à política sanitária mais restritiva que tem sido adoptada. Urge criar e financiar mais espaços destinados à alimentação destas aves, algumas criticamente em perigo, como o Abutre-negro, dotando-os de uma gestão simples mas adequada que contribua para o incremento das nossas populações de abutres.

 

# Pressão turística, imobiliária e industrial sobre os habitats litorais

 

O litoral português, apesar de legalmente protegido por diversos instrumentos de ordenamento do território, continua sob forte pressão de interesses ilegítimos e da apatia generalizada das entidades da Administração. Apesar dos discursos políticos que referem a necessidade urgente de proteger o litoral, são abundantes e recorrentes as intenções de investimentos e a homologação das mesmas pela Administração Central e Local. Projectos turistico-imobiliários ou mesmo industriais como os do Litoral Alentejano e das Dunas de Mira, já “aprovados” em Rede Natura 2000, são exemplos de atropelos com a conivência dos organismos públicos. Mas a pressão não se fica por aqui: novos empreendimentos para o Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina estão a aguardar aprovação.

 

# Barragens afundam estatutos de conservação de algumas espécies

 

A construção de 10 novas barragens é outro sinal claro de que a biodiversidade é um elemento a sacrificar, desta vez em nome de uma política energética incorrecta. Os impactes sobre espécies e habitats são claros e gritantes; passam, entre outras situações, pela criação de graves problemas à ictiofauna (muitas das nossas espécies de água-doce têm um estatuto de conservação que exige mais medidas de conservação), criando ou acentuando a fragmentação do meio lótico, situação especialmente grave para os peixes migradores, pela destruição de habitats prioritários para a conservação e pela, mais que provável, colocação em risco de importantes populações de toupeira-de-água, situação que poderá obrigar a rever o actual estatuto de conservação da espécie em Portugal (actualmente é classificada como “vulnerável”, mas poderá ficar com o estatuto de “ameaçado”).

 

# Reservas marinhas submergidas na inacção

 

Apesar dos discursos políticos que enaltecem a importância do mar para Portugal, o país tarda em honrar os seus compromissos internacionais e em salvaguardar convenientemente um recurso de primordial importância para o seu futuro. A criação de mais áreas marinhas protegidas e a gestão activa das existentes são tarefas indispensáveis para a salvaguarda da biodiversidade em Portugal e constituem uma medida essencial para a salvaguarda dos nossos depauperados recursos pesqueiros. Porém, no terreno as coisas são bem diferentes e os resultados estão à vista de todos: vastas áreas de costa não protegidas, a sobre-pesca, o uso de artes de pesca ilegais, a ausência de fiscalização que cria a impunidade. Há que dotar estes espaços de pessoas e meios adequados para monitorizar, fiscalizar e proteger a saúde dos ecossistemas marinhos, sob pena de estarmos a hipotecar o futuro das pescas. Por último, há que ter uma atenção muito especial à gestão dos meios estuarinos, que têm uma função primordial no potenciar dos recursos de pesca na área de costa.

 

 

Lisboa, 27 de Julho de 2008

 

A Direcção Nacional da Quercus- Associação Nacional de Conservação da Natureza

 

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Salinas do Samouco | Quercus apresenta queixa à União Europeia https://quercus.pt/2021/03/04/salinas-do-samouco-quercus-apresenta-queixa-a-uniao-europeia/ Thu, 04 Mar 2021 17:12:17 +0000 https://quercus.pt/?p=12545 A Quercus decidiu hoje, Dia Nacional da Conservação da Natureza, retomar as denúncias já anteriormente efectuadas pela associação junto da Comissão Europeia relativas à incapacidade do Estado português em cumprir e fiscalizar várias medidas de minimização e compensação previstas em declarações de impacte ambiental no âmbito da legislação europeia e nacional sobre esta matéria.

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De acordo com a declaração de impacte ambiental associada à construção da Ponte Vasco da Gama entre Lisboa e Alcochete em Portugal no final da década de noventa, e como condição indispensável ao financiamento pela União Europeia do projecto, ficou estabelecida a necessidade de assegurar a preservação das denominadas Salinas do Samouco, importante habitat para inúmeras espécies de avifauna e directamente atravessado pela obra. Efectivamente, a conservação da área referida foi considerada uma medida indispensável de compensação dos impactes na Zona de Protecção Especial do Estuário do Tejo.

 

O Estado Português, no ano 2000, criou a denominada Fundação das Salinas do Samouco, com gestão directamente dependente da administração central e com financiamento por parte dos Ministérios do Ambiente, Obras Públicas e também do dono da obra, a Lusoponte. Desde essa data e até há alguns meses atrás, a Fundação tem vindo a gerir os 360 hectares de zona húmida associados a uma área que em termos de conservação da natureza está classificada como um dos dez mais importantes ecossistemas com aquelas características na Europa e que por isso merece particular atenção em termos de preservação.

 

Infelizmente, o financiamento contratualizado pelos Ministérios referidos não tem sido assegurado, tendo mesmo impedido a viabilização de candidaturas LIFE envolvendo a área em causa. Assim, desde há muitos meses que as Salinas deixaram de ser objecto de qualquer gestão que assegure a preservação dos valores em causa, alegando o Governo estar a estudar um novo modelo de gestão que até agora não foi apresentado nem discutido, permanecendo as salinas ao abandono.

 

Este património, importante acima de tudo pelos valores naturais que encerra mas também por oportunidades em termos de educação e formação ambiental e de emprego, merece uma urgente atenção da vossa parte no quadro do cumprimento legal e contratual definido.

 

A Quercus reitera igualmente a enorme incapacidade que se regista noutros projectos de grande dimensão e com financiamento europeu, onde as medidas de minimização e compensação não estão a ser efectuadas e que serão alvo de próxima participação da nossa parte.

 

 

Lisboa, 28 de Julho de 2008

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Alentejo distancia-se dos cultivos transgénicos https://quercus.pt/2021/03/04/alentejo-distancia-se-dos-cultivos-transgenicos/ Thu, 04 Mar 2021 17:12:12 +0000 https://quercus.pt/?p=12544 Foram divulgados este mês pelo Ministério da Agricultura os dados oficiais para 2008 do cultivo de milho transgénico em Portugal.Embora a área total tenha aumentado 11% (486 hectares) em relação a 2007, esta subida está muito longe dos 240% (3009 hectares) verificados de 2006 para 2007.´Esta redução representa uma desaceleração significativa no interesse dos agricultores em relação à única variedade geneticamente modificada actualmente autorizada para cultivo.

 

As regiões do Alentejo e de Lisboa/Vale do Tejo apresentam as reduções mais significativas. Desde 2005, ano em que começou o cultivo em Portugal, estas eram as duas regiões com maior adesão ao milho transgénico e em 2007 representavam 86% de toda a área cultivada com OGM em Portugal. Este ano, no entanto, deu-se uma redução de 11% no total de hectares cultivados em cada uma delas. No Alentejo, em particular, este abaixamento torna-se ainda mais significativo se se considerar que a área total dedicada ao milho aumentou 10 a 15% no mesmo período, de acordo com estimativas provisórias do Ministério da Agricultura.

 

A experiência que os produtores alentejanos estão a ter com o milho transgénico fica claramente aquém das expectativas. De todas as explorações agrícolas do Alentejo que em 2007 cultivaram OGM, 48% (23 explorações em 48) já abandonaram tal opção em 2008. Este recuo significativo está em contraste com o quadro optimista que o Ministério da Agricultura tem apresentado e mostra que, apesar da forte promoção, os agricultores preferem tecnologias e práticas mais eficazes, que apresentem menores riscos para o ambiente, para a saúde humana e para a sua própria economia.

 

O fraco crescimento verificado este ano a nível nacional concentra-se quase em exclusivo na região Centro, com novos agricultores no vale do Mondego a começar agora a experimentar o que os produtores alentejanos, que começaram anos antes, já estão na fase de descartar.

 

Segundo a Profª Margarida Silva, coordenadora da Plataforma Transgénicos Fora, “O quadro português, embora com grande falta de dados concretos que o Ministério da Agricultura insiste – contra a lei – em não divulgar, aponta para uma tendência de experimentação e posterior abandono dos cultivos transgénicos por uma faixa significativa dos produtores portugueses.” Ainda de acordo com esta bióloga, “Esta leitura condiz com um estudo da Comissão Europeia recentemente divulgado(2) em que, de três regiões espanholas estudadas, o cultivo de milho transgénico não propiciava quaisquer vantagens económicas aos produtores de duas delas.”

 

(1) Disponíveis online em www.stopogm.net

(2) Vide Go_mez-Barbero et al. (2008) Bt corn in Spain – the performance of the EU’s first GM crop. Nature Biotechnology 26(4):384-386.

 

A Plataforma Transgénicos Fora é uma estrutura integrada por doze entidades não-governamentais da área do ambiente e agricultura (ARP, Aliança para a Defesa do Mundo Rural Português; ATTAC, Associação para a Taxação das Transacções Financeiras para a Ajuda ao Cidadão; CAMPO ABERTO, Associação de Defesa do Ambiente; CNA, Confederação Nacional da Agricultura; Colher para Semear, Rede Portuguesa de Variedades Tradicionais; FAPAS, Fundo para a Protecção dos Animais Selvagens; GAIA, Grupo de Acção e Intervenção Ambiental; GEOTA, Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente; LPN, Liga para a Protecção da Natureza; MPI, Movimento Pró-Informação para a Cidadania e Ambiente; QUERCUS, Associação Nacional de Conservação da Natureza; e SALVA, Associação de Produtores em Agricultura Biológica do Sul) e apoiada por dezenas de outras.

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