MINISTÉRIO DO AMBIENTE REVOGA PORTARIA COM 23 ANOS E PERMITE CAÇA NA RESERVA NATURAL DA SERRA DA MALCATA SEM FUNDAMENTAÇAO CIENTÍFICA
O governo, através Portaria n.º 19/2016 de 8 de Fevereiro, revogou a Portaria n.º 874/93 de 14 de Agosto que proibia a caça na Reserva Natural da Serra da Malcata.
A Reserva Natural da Serra da Malcata (RNSM) foi criada pelo Decreto -Lei n.º 294/81, de 16 de Outubro, e correspondeu ao reconhecimento da existência no seu território de valores botânicos e faunísticos de incontestável interesse que tornam esta Reserva Natural num ecossistema privilegiado e especialmente importante a defender. Na origem da criação da Reserva Natural da Serra da Malcata esteve o objetivo principal de proteger o Lince-ibérico, espécie que já nos anos 80 se encontrava em elevado risco de extinção e hoje possui um plano com vista à sua reintrodução em Portugal.
O lince ibérico (Lynx pardinus) possui em Portugal e a nível mundial o estatuto de ameaça de “Criticamente em Perigo”. Relativamente ao seu estatuto legal de proteção é considerado uma espécie prioritária de interesse comunitário pela Diretiva Habitats, transposta para o direito interno pelo Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de Abril, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.49/2005, de 24 de Fevereiro, que exige a designação de Sítios a integrar a Rede Natura 2000 com vista à conservação desta espécie, bem como a sua proteção rigorosa em toda a área de distribuição.
Na área da Reserva Natural da Serra da Malcata era aplicável a Portaria n.º 874/93, de 14 de setembro, que, com o objetivo de garantir a salvaguarda do património natural presente, definiu um regime cinegético específico para aquela Reserva Natural, interditando o exercício da caça, sem prejuízo de, em casos especiais devidamente fundamentados, contemplar a autorização de ações de correção visando o controlo populacional de determinadas espécies. Passados 23 anos desde a publicação daquela portaria o atual governo vem, com a sua revogação, permitir a caça na Reserva Natural da Serra da Malcata.
LONGE VÃO OS TEMPOS DO “SALVEMOS O LINCE DA SERRA DA MALCATA”
GOVERNO CEDE A PRESSÕES DO LOBY DA CAÇA
A Quercus contesta esta opção do governo, pois a mesma pode colocar em causa a recuperação de várias espécies presa que se encontram a recuperar na zona como o Corço, o Veado ou o Coelho, e ainda de espécies em perigo como o Lince, o Lobo ou o Abutre-preto.
Na maioria do território português é possível exercer a actividade cinegética, sendo muito poucas as áreas no território nacional onde não se caça.
Esta decisão do governo carece de qualquer fundamentação científica, não se conhecendo até à data nenhum estudo sobre as populações de espécies que possam vir a ser exploradas cinegeticamente.
Acresce o facto da Reserva Natural da Serra da Malcata, à semelhança de muitas outras áreas protegidas, encontrar-se com graves lacunas de funcionamento devido a falta de recursos humanos e financeiros, o que se reflete nas ações de vigilância e fiscalização realizadas. A Reserva Natural da Serra da Malcata já enfrenta graves problemas de caça furtiva, pelo que a opção de agora permitir a caça nesta área protegida só vai agravar os problemas de fiscalização na reserva.
Esta opção também representa um aumento do risco para o Plano Nacional de Reintrodução do Lince Ibérico, através do qual estão a ser investidos de milhões de euros, e que prevê que venham a ser libertados Linces nesta Área Protegida.
A QUERCUS não está contra a actividade cinegética, mas esta apresenta também riscos, como qualquer outra actividade, e neste caso não existe qualquer necessidade ou fundamentação científica que justifique permitir a caça numa reserva natural, sobrepondo os interesses da caça aos da conservação da biodiversidade. O abate a tiro é uma das principais causas de morte não natural do lince ibérico e do lobo-ibérico.
A QUERCUS irá solicitar esclarecimentos ao Ministério do Ambiente e tomar todas as medidas ao seu alcance para que a Reserva Natural da Serra da Malcata possa continuar a exercer o seu papel na conservação das espécies e habitats em perigo.
Lisboa, 12 de fevereiro de 2016
A Direção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza