Programa Nacional para a Valorização dos Territórios Comunitários

Os baldios ocupam cerca de 5% da superfície de Portugal continental, concentrando-se nas montanhas do Norte e centro de Portugal, espaços de reconhecido interesse biológico e ecológico. Nos últimos 40 anos, a evolução demográfica, as mudanças na geografia da produção de riqueza e a valorização social da cidade em detrimento da ruralidade ditaram uma progressiva perda de importância da produção de serviços ecossistémicos com valor de mercado nos baldios, e uma desregulamentação dos mecanismos de controlo da sua apropriação.

 

Em contrapartida, ganhou importância social e económica a produção de alguns serviços ecossistémicos tangíveis, ou não, tradicionalmente desconsiderados, como sejam a retenção de carbono, o refúgio de biodiversidade e a produção de água, energia e  paisagem.

 

A Quercus congratula o MADRP e a AFN pela corajosa iniciativa de criação de uma Comissão Nacional para a Valorização dos Territórios Comunitários (CNVTC). A CNVTC como era de sua incumbência produziu um PNVTC, agora entregue para discussão pública. A Quercus considera o PNVTC oportuno. Os serviços ecossistémicos fornecidos pelos baldios são demasiado importantes para o Estado, como representante do interesse colectivo português, se demitir de uma intervenção directa, ou indirecta, na sua salvaguarda e fomento. Por outro lado, como adiante se explicita, a propriedade colectiva actual está em risco pela apropriação privada e pelo livre acesso.

 

A apreciação do PNVTC pelo Quercus estrutura em três partes: apreciação genérica e apreciação na especialidade (ver parecer fazendo download do PDF em anexo).

 

Os serviços ecossistémicos prestados pelos baldios são demasiado importantes para serem esquecidos pelo Estado, supremo representante do interesse colectivo dos portugueses.

Os pressupostos para uma gestão sustentável dos recursos naturais dos baldios, admiravelmente explorados pela Prof. Elinor Ostrom, extinguiram-se nas actuais comunidades de aldeia. Os comuns estão hoje sujeitos a redes de interesses particulares imediatos, desinteressados na perenidade dos recursos, disfarçados sob um discurso ideológico colectivista, na prática não assumido.

Os serviços ecossistémicos intangíveis têm hoje uma importância acrescida (em relação ao passado), sem que o interesse colectivo na sua produção (incremento e sustentabilidade) estejam  devidamente salvaguardados. O conflito de interesses entre o colectivo português e os compartes é claro: se as sociedades de aldeia estão desreguladas, se é expectável que esta tendência se agrave no curto-médio prazo, se a importância (social e económica) relativa dos serviços ecossistémicos sem valor de mercado continuar a crescer, como pode aumentar o valor e a perenidade destes serviços – porque é esse o grande objectivo de um PNTVTC – sem uma revisão dos sistemas de gestão e de controlo do acesso aos recursos produzidos nos baldios?

 

O status quo legal – potenciado pela indefinição das fronteiras dos baldios – cadastro – é a maior ameaça à persistência da propriedade colectiva em Portugal continental.

 

O PNTVTC  é um exercício técnico conservador e inconsistente, pouco profundo e pouco inovador, pelo que, no entender da Quercus, deveria ser profundamente reformulado antes da sua aceitação como instrumento de políticas.

 

 

Lisboa, 16 de Julho de 2010

 

A Direcção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza