Parecer | Estudo de Impacte Ambiental do Aldeamento Turístico do Vale do Meco
Nos termos do disposto nos Artigo 14º do D.L. 69/2000, de 3 de Maio e 14º do D.L. 197/2005, de 8 de Novembro, relativo à participação pública nos processos de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA), vem a Quercus-Associação Nacional de Conservação da Natureza, através do seu Núcleo Regional de Setúbal, apresentar o seu parecer relativo ao Estudo de Impacte Ambiental do Projecto do Aldeamento Turístico do Meco, sito no Concelho de Sesimbra.
Considerações prévias
O projecto em apreciação consiste numa urbanização, para fins turísticos, com 100 moradias, para um total de 561 camas, numa zona rodeada por todo um conjunto de Sítios Classificados (o Sítio da Rede Natura 2000 Arrábida/Espichel, o Monumento Natural Jazida de Icnofósseis da Pedreira de Avelino, o Sítio Classificado da Gruta do Zambujal, o Parque Natural da Serra da Arrábida e a Zona de Protecção Especial do Cabo Espichel).
Neste contexto, assumirá particular importância uma avaliação que permita distinguir e diferenciar este projecto turístico de outros semelhantes na zona, bem como garantir efectivamente o uso turístico do empreendimento.
Justificação do projecto
Em nosso entender, o projecto não se encontra suficientemente justificado, pois apesar de algum cuidado na concepção do mesmo, não é perceptível qual a mais-valia deste projecto em relação a outros já aprovados na região (como por exemplo, o Projecto Turístico da Mata de Sesimbra Sul ou o Tróia Resort na Península de Tróia).
Com efeito, e tratando-se de um projecto que prevê exclusivamente a implantação de moradias, e de um conjunto de equipamentos colectivos associados, em caso de não cumprimento dos objectivos propostos, facilmente este projecto se transformará numa operação imobiliária com fins residenciais, sejam de 1a ou de 2a residência, situação em que os impactes previstos serão muito superiores em presença desta nova realidade.
Principais impactes analisados
Da análise de impactes efectuada no EIA, destacam-se os impactes mais significativos em relação ao uso do solo, aos recursos hídricos e à fauna e flora.
Com efeito, em relação aos impactes no solo, o EIA reconhece que, durante a fase de construção, a remoção do coberto vegetal e a movimentação de terras podem provocar fenómenos de erosão, bem como a contaminação do solo, devido à ocorrência de derrames e águas residuais resultantes da obra. Durante a fase de exploração, a utilização de fertilizantes e de fito-fármacos na manutenção dos espaços verdes podem contaminar o solo.
Em relação aos recursos hídricos, a compactação do solo e a remoção do coberto vegetal provocarão alterações na drenagem natural, com um aumento do escoamento superficial e menor infiltração, podendo conduzir à degradação das linhas de água superficiais e subterrâneas. A utilização de fertilizantes e fito-fármacos na manutenção dos espaços verdes podem igualmente provocar a contaminação das águas subterrâneas.
Não são analisados de forma clara os impactes de uma possível sobrecarga na rede de distribuição de água durante a fase de exploração.
Em relação à fauna e à flora, o EIA reconhece que existem espécies RELAPE na zona de intervenção, mas minimiza de uma forma absolutamente inadmissível a sua presença. De facto, a fragmentação dos habitats é uma das principais ameaças para as espécies, e o presente projecto configura uma clara fragmentação de habitats, para mais numa zona rodeada de áreas classificadas.
Por outro lado, não é analisado o impacte durante a fase de exploração decorrente da perturbação induzida pelo acréscimo de pessoas e de trânsito na envolvente da zona de intervenção, e nomeadamente nas áreas classificadas e suas periferias.
Limitações do EIA
O EIA revela-se bastante limitado, nomeadamente pela ausência da análise de alguns factores que, em nosso entender, são pertinentes para um projecto com uma envolvente de várias zonas sensíveis, do ponto de vista ecológico, patrimonial e arqueológico, como sejam a indução de tráfego na zona, as acessibilidades ao projecto, e impactes cumulativos e associados do mesmo.
Por outro lado, as medidas mitigadoras apresentadas são muito escassas, em particular para a fase de exploração, pelo que consideramos que seria necessário considerar um plano de monitorização e um plano de gestão ambiental do empreendimento.
A desactivação ou falência do projecto nunca é ponderada, o que, considerando as razões expostas acima, é crucial para se compreender o verdadeiro impacte da implementação de um projecto desta dimensão numa zona charneira entre áreas classificadas.
Conclusões
O EIA do projecto do Aldeamento Turístico do Vale do Meco apresenta algumas lacunas que não permitem avaliar de forma clara os reais impactes de um projecto desta natureza na zona e na sua envolvente.
A Quercus considera que, sem garantias de viabilidade do projecto turístico em apreciação, associadas a um plano de gestão ambiental do empreendimento durante a fase de exploração, existe o claro risco de se estar a aprovar um projecto que facilmente será transformado numa operação imobiliária em caso de falência da exploração turística.
Por este motivos, a Quercus apela a que sejam exigidas garantias de viabilidade do projecto, a par com medidas de minimização dos impactes negativos detectados e seja exigido um Plano de Gestão durante a fase de exploração.
A Quercus entende que, sem estas garantias, o projecto do Aldeamento Turístico do Vale do Meco não deverá ser aprovado.
Setúbal, 19 de Abril de 2010
A Direcção do Núcleo Regional de Setúbal da Quercus-ANCN