Amanhã, dia 16 de Novembro, comemora-se mais um Dia Nacional do Mar, instituído em 1998 para assinalar a ratificação Portuguesa da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar.´Seis anos depois do acidente com o Prestige, o nosso mar, com área 18 vezes superior ao território terrestre português e uma das cinco zonas económicas exclusivas maiores do Mundo, continua fortemente ameaçado por derrames de produtos perigosos e outras fontes de poluição, para além da escassa conservação dos recursos e da sua sobre-exploração.
Um terço do crude mundial passa pelo mar português e estima-se que 100 navios, dos quais 12 petroleiros, passem todos os dias ao longo da nossa costa.
Apesar dos anúncios de um maior investimento na protecção do nosso mar, em sequência do acidente com o Prestige em 2002 na costa da Galiza, pouco se alterou:
– Os anunciados Navios de Combate à Poluição e Navios Patrulha Oceânicos continuam em fase de construção nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.
– Só este ano foi inaugurada a 1ª fase do Sistema de Controlo de Tráfego Marítimo (VTS- Vessel Traffic Sustem) que permite afastar os navios para um corredor mais distantes da costa portuguesa;
– Apesar das promessas a nossa capacidade de vigilância marítima por meios aéreos continuam a ser insuficientes face às necessidades;
– A disponibilidade de material de combate à poluição (barreiras, recuperadores de vácuo, estações de descontaminação móvel) é manifestamente escassa;
– Portugal possui apenas cerca de 0,05% da sua ZEE com estatuto de protecção, um valor muito inferior à média Mundial (1%) e longe da meta desejável de 10% em 2010.
O Mar, fonte infinita de recursos, vazadouro de resíduos para todo o sempre. Foi esta a palavra de ordem, usada até à exaustão. Infelizmente, a realidade é bem diferente. De facto, primeiro aos cientistas e agora aos cidadãos em geral, passou a ser óbvio que o Mar constitui uma importante e fundamental fonte de recursos e benefícios, mas finitos. Muitos deles estão mesmo ameaçados pela actuação irresponsável por parte dos que os utilizam. São muitos os actores deste drama (ou farsa?) no palco dos oceanos e das zonas costeiras, aqueles que usam e abusam dos recursos em nome da necessidade de fornecer alimento, comércio e serviços às populações humanas. Desde os que exploram os recursos vivos, seja pela pesca ou pela aquicultura, aos que exploram a paisagem, pelas indústrias do turismo e do lazer, aos transportes marítimos e actividades conexas, dentro e fora de zonas portuárias, aos que usam as potencialidades energéticas das ondas, correntes e marés, e ainda os que usam as zonas costeiras e o mar como destino de deposição de resíduos, quer legalizados e mediados por estações de tratamento e exaustores associados, quer os responsáveis pela contínua degradação dos ecossistemas costeiros por múltiplas fontes difusas de poluição, que tardam em ser erradicadas, todos em conjunto sobre-explorando os recursos do mar, limitando as suas potencialidades presentes e futuras.
Seríamos totalmente injustos se não referíssemos algumas melhorias na qualidade das zonas balneares ou na redução das emissões poluentes, ou ainda na limitação territorial de algumas acções mais agressivas para o ambiente, fruto do aparecimento, ao longo dos últimos anos, de instrumentos de planeamento e gestão do território. Contudo, a sua aplicação continua alvo de displicência e ineficácia por parte dos que têm por missão a sua implementação e fiscalização.
O exercício da pesca tem sido enquadrado por múltipla regulamentação, quer de origem nacional quer europeia, no sentido de limitar ou travar o desaparecimento dos recursos vivos do mar. No entanto, devido a múltiplos factores, os resultados não têm sido brilhantes. Longe disso, os recursos continuam a desaparecer e a quantidade de espécies que se encontram em estado de sobre-exploração tem aumentado continuamente, de acordo com as análises da FAO. Também persiste o desacordo entre os vários actores do sector pesqueiro, apesar da tibieza na fiscalização, bem como da frouxa aplicação das recomendações técnicas sobre qual o nível de exploração a que devem ser submetidos os recursos, apesar de todos os diagnósticos científicos efectuados mostrarem os graves problemas existentes.
De uma forma mais concreta, apesar do estado depauperado de grande parte dos recursos vivos marinhos, os governos e a Comissão Europeia continuam a apoiar e financiar o aumento da capacidade que os navios têm para capturar mais peixe, mesmo reduzindo o número total de barcos e de pescadores, contradizendo assim os seus próprios princípios de gestão sustentável. Apesar de toda a regulamentação existente, as capturas de muitas espécies reduzem-se ano após ano mas há arrastões com capacidade de pescar mais, mais longe e mais fundo. A redução dos recursos disponíveis afecta principalmente as pequenas comunidades piscatórias, as quais não estão isentas de responsabilidades nessa redução, utilizando muitas vezes mais redes do que as autorizadas ou recorrendo a outros métodos menos legais.
Torna-se por isso fundamental: exigir mais coerência aos organismos comunitários e nacionais, no sentido de respeitar as recomendações técnicas e aplicar eficazes programas de recuperação dos recursos; apontar, como solução de problemas sociais derivados dessas medidas, a aplicação de programas de apoio às comunidades piscatórias, principalmente quando essas comunidades se vejam impedidas de capturar os recursos que tradicionalmente exploram; e envolver os cidadãos, elucidando-os e veiculando informação relevante para que cada um de nós possa ser um consumidor esclarecido.
Lisboa, 15 de Novembro de 2008
FAPAS – Fundo Para a Protecção do Animais Selvagens
QUERCUS – Associação Nacional de Conservação da Natureza