Aplicação dos 5R’s em Portugal continua a ser uma miragem!

A aplicação dos 5R’s em Portugal continua a ser uma miragem! A produção de resíduos urbanos tem aumentado nos últimos anos, as soluções de reutilização ainda são pouco competitivas e divulgadas, as taxas de reciclagem estão longe de serem atingidas, a deposição em aterro continua a ser o destino para onde vão a maioria dos resíduos urbanos e a compostagem ainda não tem expressão na realidade nacional. Face às metas ambiciosas que a Europa nos propõe para o futuro, se o esforço de Portugal não for grande, para a Quercus o que nos espera será uma missão impossível.

 

O Ministério apresentou as linhas gerais do novo modelo do Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos para um período pós 2020 (PERSU 2020+), que contou com a colaboração alargada de diversas entidades, entre as quais a Quercus, com o objetivo de apresentar melhores indicadores e soluções para futuro, que pretenda dar resposta às ambiciosas metas que nos esperam.

 

Com base no trabalho que a Quercus tem vindo a desenvolver, não só com a participação neste grupo de trabalho, como também em articulação com os intervenientes do setor, desde o produtor ao consumidor, até ao reciclador ou ao destino final, temos procurado perceber quais são as maiores fragilidades e oportunidades deste mercado, numa abordagem que procura junto destes parceiros encontrar soluções que funcionem e permitam o mercado responder às necessidades.

 

 

Neste sentido, salientamos os pontos positivos do modelo do PERSU 2020+ apresentado:

 

1) Apostar em campanhas para reduzir – logo menos produção de resíduos;

 

2) Recolha de RUB – resíduos urbanos biodegradáveis (incluindo os resíduos de jardins e a fração orgânica das habitações);

 

3) A aposta na recolha seletiva, incluindo a recolha de outras tipologias de resíduos como os resíduos de têxteis ou as pequenas quantidades de resíduos perigosos;

 

4) Otimizar as infraestruturas existentes de tratamento de lixo, mesmo estando em contraciclo com a Europa que aponta para o abandono do tratamento mecânico e biológico. Os investimentos feitos no passado nestas infraestruturas não devem ser desaproveitados, num momento em que toda a ajuda é necessária para implementar processos de reciclagem que potenciem os resultados desejados.

 

5) Incentivar o escoamento o composto proveniente da valorização orgânica;

 

6) Modelos de tara retornável para diversos tipos de resíduos.

 

 

Há no entanto medidas que a Quercus considera fundamentais para mudar o paradigma atual na gestão de resíduos, que deviam merecer uma maior atenção por parte deste novo Plano, as quais enumeramos:

 

1) Falta de fortes incentivos que contrariem a deposição em aterro, como o aumento substancial da Taxa de Gestão de Resíduos, ou taxar as matérias primas naturais. Continuamos a despejar lixo em aterro, incluindo os biodegradáveis que no último ano atingiu os 43%, apesar da meta futura apontar para um limite de apenas 10% em 2025;

 

2) Obrigar os produtores e utilizar embalagens monomaterial e com incorporação de matéria prima reciclada. Esta solução cria menos confusão na hora de separar o lixo e contribui para aumentar as taxas de reciclagem e o escoamento do material reciclado;

 

3) Regular sobre a qualidade do composto proveniente da valorização orgânica ou compostagem para facilitar o escoamento deste fertilizante para a agricultura ou outras utilizações;

 

4) Forte aposta na recolha da fração orgânica a nível nacional, não se ficando por projetos pilotos. Os bioresíduos correspondem a 40% da totalidade do lixo produzido por cada Português e quando misturados com os resíduos recicláveis dificultam a sua recuperação quer para reciclagem quer para produção de CDR – Combustível derivado de resíduos, facto que leva a que uma parte significativa dos resíduos rejeitados das unidades de triagem sejam encaminhados para aterros.

 

Em Portugal cada habitante produz 482kg de resíduos urbanos por ano. Compramos cada vez mais produtos embalados e a diversidade de materiais diferentes que compõem as suas embalagens aliados à falta de sensibilização para a recolha seletiva não se traduz em resultados satisfatórios – apenas 16,5% do total de resíduos produzidos em Portugal provem da recolha seletiva. Não conseguimos traçar um modelo contínuo num país onde as assimetrias levam a que em muitas localidades ainda não existam ecopontos, contribuindo para que a recolha de lixo indiferenciado atinja valores elevados na ordem dos 83,5% do total produzidos por ano.

 

Por outro lado, não estamos a reduzir a produção de resíduos e os exemplos de reutilização ou recuperação de materiais são ainda insipientes e pouco divulgados. No que respeita à reciclagem estamos longe de atingir a meta dos 50% em 2020, uma vez que atualmente não ultrapassamos os 38%. Não podemos esquecer que vivemos uma realidade em que a deposição em aterro domina os destinos dos resíduos em Portugal alcançando 32%, sem considerarmos os refugos das estações de tratamento dos lixos urbanos, quando as perspetivas futuras apontam para a deposição não ultrapasse os 10% até 2030. Para a Quercus é um dado assente que a implementação da política dos 5 R’s em Portugal continua a ser uma miragem.

 

A Europa definiu metas ainda mais ambiciosas para os resíduos, com a obrigatoriedade de aumentar e diversificar a recolha seletiva. Assim até 2035 cada Estado Membro deverá reciclar até 65% dos seus resíduos e limitar a deposição em aterro, especialmente dos bioresíduos. Por outro lado, a responsabilização de quem coloca os produtos no mercado é cada vez mais considerada através da responsabilidade alargada do produtor. Mas as recomendações não se ficam por aqui, é fundamental aplicar tarifários mais justos para quem separa e encaminha os seus resíduos para reciclagem.

 

Assim, a Quercus considera que não podemos continuar com esta política de gestão de resíduos que funciona atualmente em autogestão, o Ministério precisa de ser mais arrojado nas medidas, devendo as mesmas serem implementadas por todos os intervenientes no setor.

 

Pelos atrasos na aprovação de fundos comunitários, são reivindicados mais dois anos para cumprir as metas, a Quercus não considera que esse período vá fazer uma grande diferença nos 12% que nos falta atingir.

 

É por isso URGENTE ajudar os Portugueses a dar o passo em frente, educar, informar e adotar novas medidas que promovam uma maior circularidade na gestão dos resíduos em Portugal é obrigatório. A educação ambiental deve ser prioridade para se conseguir atingir as metas de 2020 e aquelas que nos esperam no futuro pós 2020.

 

 

Lisboa, 20 de novembro de 2018

A Direção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza